7 de abril de 2017
Por Claudio Henrique dos Santos*, jornalista, escritor e palestrante
Um estudo científico realizado nos Estados Unidos e publicado
recentemente pela revista Science mostra como a influência do machismo
na sociedade começa a bagunçar a cabeça das nossas meninas desde a mais
tenra idade. Segundo os cientistas americanos, a partir dos seis anos de
idade, as meninas começam a adquirir a percepção de que os meninos são
mais corajosos, fazem grandes descobertas e são muito inteligentes. Já
as meninas, na visão delas mesmas, não são tão inteligentes assim.
Os cientistas concluíram, ainda, que até os cinco anos, garotos e
garotas associavam de modo semelhante o próprio gênero à inteligência,
mas que a partir dos seis anos, as meninas se mostram menos propensas a
fazer tal associação. Isso explica, em parte, o fato das mulheres mais
jovens se afastarem das carreiras consideradas mais complexas, como as
ligadas à área das ciências exatas.
É muito triste perceber como desde cedo o machismo implícito na nossa
sociedade começa a minar a confiança das nossas meninas. Eu, que sou
pai de uma, vivi um exemplo muito claro na minha casa. Antes de contar
esse caso, vale uma explicação. Por conta de um convite profissional
recebido pela minha esposa, durante um período da minha vida eu parei de
trabalhar para cuidar da casa e me dedicar à minha filha. Minha esposa
trabalhava e sustentava a casa, enquanto eu participava de todas as
reuniões da minha filha na escola e preparava o jantar, por exemplo. Na
minha casa, nunca convivemos com os clássicos estereótipos de gênero.
Certo dia, fomos a um parque de diversões e numa das atrações mais
concorridas, depois de enfrentarmos uma fila enorme, minha filha acabou
ficando com medo e pediu para sair na última hora. Alguns meses depois,
assistindo à televisão, nos deparamos com uma matéria destacando
exatamente aquele brinquedo. Minha filha, àquela altura com quase sete
anos de idade, olha para mim com uma carinha triste e me pede desculpas
por ter desistido naquele dia.
Estranhei o pedido de desculpas, que veio com uma explicação: “pai,
eu não fui no brinquedo porque sou menina. Se eu fosse menino, eu teria
ido”. Diante da minha cara de espanto, ela se viu na obrigação de
explicar melhor: “ora pai, menino é muito mais corajoso do que menina.
Como é que você é menino e não sabe disso”?
Depois de tentar entender de onde ela tinha tirado aquela ideia,
tivemos uma longa conversa e procurei explicar que tanto as meninas
quanto os meninos podem ter medo – lembrei a ela do meu pavor de nadar,
enquanto ela parece um peixe na piscina. Nosso papo terminou comigo
pedindo a ela que não repetisse mais esse pensamento e que nunca
deixasse de fazer qualquer coisa na vida dela apenas pelo fato de ser
uma mulher.
Apesar dessa conversa, neste dia caiu minha ficha sobre como a
sociedade acaba impondo na cabeça das nossas crianças os velhos
estereótipos de gênero. Do nada, minha filha, por exemplo, tinha não
somente acreditado, mas incorporado a ideia de que os meninos são mais
corajosos. Por isso, como pais e mães, temos o dever de encorajar nossas
meninas a se atreverem a ousar, a fazer tudo o que quiserem, a exemplo
do que fazem os meninos, sem medos ou julgamentos, mesmo que as pessoas
ao redor digam ao contrário.
Precisamos lembrar nossas meninas de que o céu é o limite. Devemos
prepará-las para chegarem a Marte, descobrirem a cura da mais resistente
das doenças, serem atletas de ponta, desbravarem florestas e oceanos,
liderarem o mundo ou cuidarem da casa e dos filhos, como eu mesmo fiz
durante um período da minha vida. Mas que elas o façam por uma opção
própria e não por uma imposição da sociedade.
*Cláudio Henrique dos Santos é jornalista, escritor, palestrante e autor dos livros “Macho do Século XXI” e “Mulheres modernas, dilemas modernos”. Participou do Papo de Mãe sobre ‘homens que são donos de casa’.
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