O Brasil dos dias de hoje possui semelhanças assustadoras com o que transcorreu na economia norte-americana dos anos 1930
1- Desde meados de 2014, a economia brasileira entrou em
forte desaceleração. Em 2015, recebeu choques internos que transformaram
a desaceleração em recessão. Foram cortes de gastos públicos, elevação
dos preços dos combustíveis, aumento das tarifas de energia elétrica,
crescimento das taxas de juros e desmonte (através de instrumentos
econômico-judiciais) dos setores de petróleo e gás e da construção
civil. Assim, desde então, a economia brasileira se fragilizou e
mergulhou numa depressão.
2- Nos últimos cinco anos, a economia e seus investimentos
crescem ou decrescem com taxas pífias. Não há sinais de recuperação,
apenas de sobrevivência. Uma boa metáfora é que a economia suspira no
fundo do poço chamado depressão. Historicamente, a caracterização de uma
economia em estado depressão nos ensina que o setor privado não é capaz
de religar o motor de partida da economia sob tais condições.
3- A década de 1930 nos Estados Unidos é uma boa
referência histórica para entendermos a economia brasileira nos dias de
hoje. Em 1929, a economia entrou em crise com forte recessão e alto
desemprego. “O ponto culminante desses desastres econômicos foi
alcançado após um período em que se acreditava que os conselhos
financeiros ortodoxos e os altos círculos financeiros dos Estados Unidos
exerciam grande influência sobre o presidente Hebert Hoover e seus
assessores”, disse àquela época o economista John Maynard Keynes.
4- “A própria depressão é a causa dos déficits do governo …
[há] queda na receita de tributação. A dívida pública é inevitável em
um momento em que o gasto privado é inadequado: é melhor incorrer em
dívida pública para elevar o emprego e promover a atividade industrial
do que sofrer passivamente …”, complementou Keynes.
5- No início da Grande Depressão da economia
norte-americana, muitos “deram apoio a Andrew Mellon, o secretário do
Tesouro do presidente Hebert Hoover, e à sua tentativa de restaurar o
equilíbrio fiscal: a recessão causara uma queda na arrecadação de
impostos mais acelerada que a dos gastos. Para restaurar a ‘confiança’,
segundo acreditavam os conservadores fiscais de Wall Street, era
necessário cortar gastos, um após o outro”, descreveu Joseph Stiglitz.
6- O Brasil dos dias de hoje possui semelhanças
assustadoras com o que transcorreu na economia norte-americana dos anos
1930. Primeiramente, a influência dos “altos círculos financeiros” sobre
o presidente e seus economistas é evidente. Em segundo lugar, o
diagnóstico é o mesmo e, por conseguinte, o receituário proposto também.
É fácil prever que os resultados também serão coincidentes.
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7- Nos Estados Unidos, o resultado foi desastroso. A
sequela mais aparente foram as Hoovervilles que eram os enormes
acampamentos ou “favelas improvisadas” espalhadas pelas ruas das cidades
norte-americanas. Eram casas feitas de papelão e sucatas. Seus
moradores eram desempregados pedintes e que recebiam sopa quente
(sopões) de grupos de voluntários. Cenário semelhante já aparece nas
grandes cidades brasileiras.
8- Recentemente, o governo brasileiro lançou um pacotão de
medidas de corte de gastos públicos. São três pacotes, mas somente
trataremos daquele que ficou conhecido como Proposta Emergencial. O alvo
são os serviços públicos e seus servidores. Há uma certa dúvida no ar:
alguns pensam que as medidas somente serão colocadas em prática se e
quando a situação orçamentária do governo se agravar. Ledo engano, as
condições descritas para a adoção das medidas são aquelas que já vivemos
nos dias de hoje. Portanto, as medidas são para aplicação imediata.
9- As medidas podem ser divididas em dois níveis: aquelas
que impedem a melhoria e aquelas que pioram a oferta de serviços
públicos e, em consequência, agravarão a situação econômica e social do
país. Entre as primeiras, estão: “ficam vedadas … concessão, a qualquer
título, de vantagem, aumento, reajuste ou adequação de remuneração de
servidores e empregados públicos … admissão ou contratação de pessoal, a
qualquer título, … realização de concurso público … combate às
desigualdades regionais” (Proposta de Emenda Constitucional – chamada de
Emergencial).
10- Entre aquelas que vão piorar a qualidade dos serviços
públicos estão: “redução temporária da jornada de trabalho, com
adequação proporcional dos subsídios e vencimentos à nova carga horária,
em, no máximo, 25% (vinte e cinco por cento) … suspensão de progressão e
da promoção funcional em carreira de agentes públicos … durante o
período de suspensão ficam vedados quaisquer atos que impliquem
reconhecimento, concessão ou pagamento de progressão, promoção,
reajustes e revisões … não se constituindo desta suspensão quaisquer
efeitos obrigacionais futuros” (Proposta Emergencial).
11- O que o Brasil precisa é exatamente o oposto. São
necessárias medidas para melhorar a qualidade e a cobertura dos serviços
públicos na medida em que a economia está em depressão e é imperativo
socorrer milhões de trabalhadores que estão desempregados e famílias que
estão em condição de miséria. As medidas que pioram os serviços
públicos agravam a situação porque reduzirão a sua oferta em 25% e
desmotivarão os servidores porque terão seus salários nominais reduzidos
e, além disso, não poderão ser promovidos (de acordo com avaliação de
mérito e eficiência). Com menos salários pagos aos servidores públicos,
haverá menos consumo, haverá menos comércio, haverá redução da produção,
haverá aumento do desemprego no setor privado.
12- Nos Estados Unidos, após quatros anos de crise
econômica e social agravada pelas medidas adotadas por Hoover, foi
eleito em 1932 e começou a governar em 1933 Franklin Delano Roosevelt,
que lançou um plano global de reforma da economia norte-americana. Seu
plano foi batizado de New Deal, ou seja, um novo acordo econômico e
social que envolvia toda a sociedade norte-americana. O New Deal não foi
somente um grande programa de geração de empregos, foi muito mais que
isso.
13- Entre as medidas adotadas pelo governo Roosevelt,
estavam: geração de empregos, inclusive para artistas e jovens;
construção de infraestrutura (estradas, distribuição de água e
eletrificação), reforma e construção de prédios públicos (principalmente
escolas); reorganização da agricultura; reorganização da indústria com
atenção para reduzir o poder das grandes corporações; regulação bancária
e proteção do correntista e do devedor; estimulo à ampliação da
sindicalização; criação de aposentadoria para idosos; limitação da
jornada de trabalho; criação do salário mínimo.
14- A causa do grande problema econômico brasileiro é o
desemprego. Os problemas orçamentários do governo são apenas os
sintomas. Nenhuma vez a palavra desemprego aparece nos pacotes
lançados pelo governo nem na justificativa dessas medidas. Nossos
problemas orçamentários fiscais têm como causa o desemprego. Sem
empregos, trabalhadores não consomem, empresários reduzem a produção e
não investem e o governo arrecada cada vez menos impostos. O déficit
público se agrava. A chamada Proposta Emergencial vai agravar o
desemprego e vai aumentar, portanto, o problema orçamentário do governo.
15- A administração econômica e social de um país deve ser
balizada por critérios de eficiência. A pergunta deve ser sempre qual
medida é eficaz para alcançar determinado objetivo – e não se tal ou
qual medida pertence a essa ou aquela ideologia. Medidas econômicas
devem ser eficientes e não medidas de adoração a uma determinada
ideologia (o neoliberalismo).
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