quinta-feira, 7 de novembro de 2019

RECICLAGEM DE RESÍDUOS TÊXTEIS, caminho viável para uma economia circular

Bolsa feita a partir de resíduos das roupas da Hering, apresentada na edição de 2019 do projeto Trama Afetiva da Fundação Hering
BOLSA FEITA A PARTIR DE RESÍDUOS DAS ROUPAS DA HERING, APRESENTADA NA EDIÇÃO DE 2019 DO PROJETO 
TRAMA AFETIVA DA FUNDAÇÃO HERING

Pensar que o desenvolvimento econômico não 

caminha junto com a sustentabilidade é, além 

de ultrapassado, equivocado

Por Dandara Valadares


O Brasil é a maior cadeia têxtil completa 
do Ocidente. Produzimos fibras, passamos 
por fiações e tecelagens, temos a maior 
semana de moda da América Latina, 
confecções e ainda um varejo aquecido. 
Contudo, essa indústria gera 175 mil 
toneladas de resíduos têxteis por ano, 
de acordo com a Associação Brasileira 
da Indústria Têxtil (Abit) – 48 toneladas 
por dia só no município de São Paulo, 
de acordo com o Dieese, os quais possuem 
potencial para reciclagem e reaproveitamento.
A reciclagem de resíduos têxteis ainda acontece de forma experimental 
no País. Assim, todo resíduo acaba sendo destinado a aterros, demorando 
até 400 anos para se decompor (como o poliéster), ou é incinerado, 
liberando gases tóxicos responsáveis pelo efeito estufa, mudanças 
climáticas e poluição do ar. Esses gases tóxicos são emitidos não 
só na incineração no final da cadeia, mas em todas as etapas de produção.
A mistura de fibras e aviamentos dificulta a reciclagem, pois a segregação 
de materiais acaba exigindo uma mão de obra que inviabiliza o processo. 
Nesse ponto, percebemos que a destinação e ciclo de vida de um produto 
precisa ser pensado desde o momento de sua criação. O descarte não 
vem sendo levado em conta pela indústria tradicional, que, ainda com o 
pensamento de uma economia linear, entende que é responsável pela 
produção e comercialização de um produto, mas não pela destinação correta 
no fim de sua vida útil.
Nós também enquanto consumidores nos preocupamos muito mais com 
a compra de novos produtos do que com a destinação correta de seus resíduos.
Em 2010, foi instituída a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), 
colocando o Brasil em patamar de igualdade aos principais países desenvolvidos 
no que concerne ao marco legal e inova com a inclusão de catadoras e catadores 
de materiais recicláveis e reutilizáveis, tanto na Logística Reversa quando na 
Coleta Seletiva. Sob a Lei nº 12.305/10, a PNRS institui a responsabilidade 
compartilhada dos geradores de resíduo, ou seja, setor público, indústria, 
comerciantes e consumidores.
No entanto, além da falta de ações educativas para a sociedade, o 
próprio Ministério do Meio Ambiente aponta fragilidades no projeto, 
como falta de recurso para promover a coleta seletiva e a fiscalização 
e há pouco estímulo à cooperação entre os segmentos que deveriam estar 
envolvidos na gestão de resíduos.
Os governos possuem o poder de regulamentar e incentivar práticas mais 
sustentáveis, mas percebemos que globalmente ainda é privilegiado o 
crescimento econômico sobre o desenvolvimento sustentável. Os 
governos poderiam incentivar uma “corrida pelo primeiro lugar”, 
em que cidadãos e empresas sejam solicitados, incentivados e apoiados à 
adotar medidas de desenvolvimento sustentável. Contudo, o que vemos 
é a falta de maturidade de representantes da sociedade no entendimento 
da economia circular e oportunidades do desenvolvimento sustentável.
Ao mesmo tempo, o papel do governo é primordial no estímulo à 
essa mudança de mentalidade e na promoção de mudanças estruturais, 
de uma forma que seja interessante para as indústrias e consumidores. 
Pensar que o desenvolvimento econômico não caminha junto com 
a sustentabilidade é, além de ultrapassado, equivocado.
Podemos começar essa mudança pela nossa percepção do que é considerado 
lixo. Lembrando que não existe “jogar fora” do planeta, é essencial pensar 
no descarte com a mesma importância que pensamos nas outras etapas do 
ciclo de vida de um produto.
A partir dessa mudança de mentalidade, conseguimos enxergar nos resíduos 
uma nova oportunidade de mercado. Através da reciclagem, da reinserção de 
resíduos na cadeia produtiva, ou até mesmo compra e venda desses resíduos, 
empresas encontram soluções estratégicas que viabilizem a responsabilidade 
socioambiental.

A utilização de resíduos como matéria-prima na 

prática

Em sua edição de 2019, o projeto Trama Afetiva da Fundação Hering 
trouxe como tema “Um novo passo rumo à Economia Circular”. Foi 
apresentado um tecido de feltro feito a partir da desfibração de peças com 
defeitos de fábrica da Cia. Hering e que foram submetidas a um processo 
de tecelagem industrial, realizado pela empresa paulista Feltros Santa Fé.     
ACESSÓRIOS DESENVOLVIDOS ATRAVÉS DO FELTRO RECICLADO, TRAMA AFETIVA 2019
O reuso e a reciclagem de materiais são primordiais para evitar a produção de 
novas matérias-primas. Segundo o CEO da Santa Fé, Luciano Amado, 
“sustentabilidade não é só um valor que defendemos, é a base de produção 
da nossa empresa. Tiramos 41 milhões de PETs/mês do lixo, transformamos 
em mais de 700 variações de feltros que são usados por um universo de artesãs 
que já soma 14 milhões.”
O estúdio Ratoroi criou a partir de sacolas plásticas recicladas o Byeplastic, 
um laminado de plástico que está sendo usados desde objetos de decoração à 
acessórios de moda.
POCHETE DESENVOLVIDA COM O BYEPLASTIC EM COLABORAÇÃO COM 
AS MARCAS MARIA TANGERINA E JOUER COUTURE
Já a Sagui é uma marca de óculos que reutiliza para cada armação, de 3 a 5 tubos 
de pasta de dente e uma sacola plástica.
ÓCULOS DA MARCA SAGUI
Projetos como esses mostram que, sim, é possível repensar e melhorar a 
forma como as roupas, embalagens e outros materiais são produzidos, 
consumidos e descartados. De acordo com o relatório A new textiles economy 
da Fundação Ellen MacArthur, o número de vezes em que uma roupa é vestida 
caiu 36% nos últimos 15 anos. Nos EUA por exemplo, as roupas são usadas 
1/4 a menos que a média global, e o número de vezes de uso na China caiu 
70% nos últimos 15 anos. Esse desperdício representa 460 bilhões de dólares 
para esses consumidores, que descartam suas roupas após 7 a 10 usos.
Ainda de acordo com o relatório, menos de 1% das roupas são recicladas ou 
reutilizadas no mundo. Esse número mostra que o mercado de resíduos têxteis 
ainda é infimamente aproveitado, e que é um mercado com potencial, considerando 
que o modelo de economia linear não se sustenta mais no mundo contemporâneo. 
A transição para uma economia circular exige mudanças estruturais no sistema, 
mas é urgente e de responsabilidade de todos nós, sejamos governos, indústrias 
ou consumidores.   
Dandara Valadares faz parte da equipe de comunicação e articulação de 
campanha nacional do Fashion Revolution Brasil

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