Para ministro do Supremo, 'qualquer projeto no Brasil depende de recursos do BNDES, da Caixa Econômica ou da ajuda do prefeito'.
5 mai 2018
08h33
Uma 'sociedade viciada em Estado', com uma cultura de 'desigualdade' e
'desonestidade institucionalizada'. Para o ministro Luís Roberto
Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), esses são os três principais
problemas ainda enfrentados pelo Brasil.
Em palestra no Brasil Forum UK- evento no Reino Unido organizado por
estudantes brasileiros - Barroso elencou, neste sábado (5), os
principais desafios do país e avanços alcançados nos últimos 30 anos,
desde que a Constituição Federal entrou em vigor.
No rol de "desafios" a serem enfrentados, ele citou "a permanente
dependência e onipresença do Estado". Para o ministro, atualmente
"qualquer projeto no Brasil depende do Estado, de financiamento do
BNDES, da Caixa Econômica ou da ajuda do prefeito."
"Criamos uma sociedade viciada no Estado. Temos que expandir a
sociedade civil. Essa presença excessiva do Estado gera uma cultura de
compadrio e favorecimento que está por trás do loteamento de cargos
públicos", afirmou.
Após a palestra, perguntado por jornalistas onde ele acredita que o Estado deve "recuar", o ministro não quis responder.
O segundo problema citado por Barroso é o que chamou de
'patrimonialismo'. De acordo com o ministro, o Brasil herdou do
colonização portuguesa uma dificuldade em "separar o capital público do
privado".
"Essa é uma disfunção que ainda não superamos. Ainda temos, no Brasil,
elites extrativistas que conduzem o país apropriando-se do espaço
publico para repartir em feudos e loteamentos."
A confusão entre o público e privado teria gerado, conforme o ministro,
uma "cultura fisiológica de desonestidade institucionalizada". Barroso
afirmou que, embora haja uma "corrupção sistêmica", a sociedade
brasileira tem tido "a coragem" de não de "não mais varrer para debaixo
do tapete".
"A corrupção no Brasil não foi produto de um conjunto de falhas
individuais, é uma corrupçãoo sistêmica e endêmica que envolver
estatais, agentes públicos, privados, membros do Executivo, do
Legislativo", disse, avaliando que a corrupção não é um "fenômeno de um
partido ou governo".
'Cada um quer sua prisão especial'
Por fim, Barroso argumentou que ainda existe no país uma "cultura
histórica de desigualdade", com setores reivindicando privilégios, como
foro privilegiado para políticos e prisão especial.
"Ainda vivemos um país em que, talvez pelo fruto da escravidão, há a
crença de que ainda existem superiores e inferiores. Criamos cultura em
que cada um quer imunidade tributária, quer seu foro privilegiado, seu
carro oficial e sua prisão especial", exemplificou.
Entre os "avanços", Barroso mencionou o fato de a democracia no Brasil
estar vigorando sem "rupturas". Ele disse que o impeachment da
ex-presidente Dilma Rousseff foi um "trauma", mas que não representou
uma violação da lei e da Constituição.
"Sei que o impeachment foi um trauma, mas é preciso fazer distinção
entre a dimensão política e institucional. Do ponto de vista político,
as pessoas podem ter diferentes visões e eu mesmo tenho a minha visão
crítica, que eu não posso manifestar. Mas, do ponto de vista
jurídico-institucional, seguiu-se o que estava previsto na
Constituição."
'Universidade pública não dá retorno'
Durante a palestra, Barroso defendeu aumentar as fontes de
financiamento das universidades públicas brasileiras. Para ele, essas
instituições são "caras" e não dão o retorno esperado à sociedade.
Ele defendeu, por exemplo, que as universidades possam buscar recursos
vendendo projetos, prestando serviços à sociedade e recebendo doações de
ex-alunos e empresários.
"Outro problema a universidade pública. Ela custa caro e dá baixo
retorno. O Estado brasileiro não tem dinheiro suficiente para bancar uma
universidade pública com a qualidade que o Brasil precisa", afirmou,
destacando, porém, que não é a favor de privatizar essas universidades.
"A universidade tem que ser capaz de auto-sustentabilidade, prestar
serviços com à sociedade, e obter filantropia. Já há ricos suficientes
no Brasil. Eles dão dinheiro a Harvard e a Yale."
Para o ministro, o foco do investimento público em educação deve ser o
ensino básico. "A universidade publica é muito importante, mas o Estado
tem obrigações também com o ensino básico e a universidade tem que ser
capaz de arrecadar legitimamente recursos. Não é privatização e
arrecadar dinheiro", afirmou durante a palestra.
Candidatura
Barroso também foi perguntado por jornalistas se pensa em se candidatar a algum cargo eletivo.
"Em nenhum momento. Sou juiz e minha ideia é servir ao país como juiz.
Se eu me seduzir por essa ideia (candidatura), desautoriza tudo o que eu
faço", respondeu.
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