Muitas mães acreditam que o parto cesáreo é o melhor
para si e para os bebês. Mas, muitas vezes, trata-se mais da
conveniência dos médicos, acarretando riscos de saúde desnecessários e
traumas futuros.
"O primeiro erro já foi da ginecologista", conta ela. Era uma consulta de rotina, em que a médica fez um exame de toque vaginal, confirmando que o bebê já havia se virado e se encontrava na posição certa para o parto. "Eu sabia que alguma coisa não estava bem, eu teria notado a virada do bebê."
Gülsah expressou suas dúvidas e pediu uma ultrassonografia. A ginecologista se recusou terminantemente - afinal de contas, era capaz de distinguir uma cabeça de um traseiro. Mas a intuição da gestante não se enganara: o bebê não se virara, e o resultado foi um parto cesariano sob anestesia geral.
O parto de Emilia foi uma das 31,8% de cesarianas realizadas na Alemanha em 2014. Desde então, essa taxa até baixou – segundo o Departamento Federal de Estatísticas dois anos mais tarde ela estava em 30,5% – mas a Organização Mundial de Saúde (OMS) ainda a considera alta demais.
Segundo a entidade, a operação só é necessária em 10% a 15% dos partos, a fim de salvar a vida da mãe ou da criança. Em todos os demais, não há indicação médica. Em contrapartida, em diversos países africanos a incidência de partos cesáreos é baixa demais, resultando em mortalidade excessiva de grávidas e recém-nascidos.
Sobretudo nas regiões rurais, onde a próxima clínica é inacessível, o parto permanece a arcaica luta entre vida e morte, que as mulheres enfrentam há milênios – ou na qual sucumbem. A mortalidade materna em Serra Leoa é a mais elevada de todo o mundo: lá, cesarianas poderiam salvar vidas.
Mas também na África, quanto mais perto se chega das cidades, mais acessíveis são as clínicas, e mais frequentes os partos cesáreos. Quem tem dinheiro, escolhe a forma de dar à luz moderna, e supostamente mais segura. Por isso, não só na Alemanha, mas também nos Estados Unidos, México, China e Austrália um de cada três bebês nasce com a ajuda do bisturi. No Brasil, a taxa de cesarianas se aproxima de 60%. Há alguns motivos para tal, mas que em geral pouco têm a ver com necessidade clínica.
Medos infundados
Em torno da intervenção acumulam-se numerosos mitos, sugerindo que ela seja a opção mais agradável para a mãe e para o filho. No entanto é relativamente reduzido o número de mulheres que preferem uma cesariana planejada, sem indicação médica, a um parto normal.
"Cerca de 5% das mulheres que nos procuram querem de qualquer jeito uma cesárea planejada", revela Patricia van de Vondel, médica-chefe da Clínica Feminina do Hospital Porz am Rhein. Para elas, os argumentos principais são a possibilidade de planejar e a sensação de poderem manter o controle.
"Também há mulheres que têm medo, pânico das dores de um parto vaginal ou de não ter forças para enfrentar a maratona dos trabalhos", explica a ginecologista. Muitos desses temores poderiam ser afastados com uma conversa de aconselhamento intensiva. "Eu nunca vi, mas realmente nunca, uma mulher não conseguir colocar seu filho no mundo por não ter força suficiente."
Riscos para o recém-nascido
Totalmente equivocada, por outro lado, é a noção de que a cesariana seja melhor para o nascituro, prossegue Van de Vondel. Naturalmente a prioridade máxima é mãe e criança irem sãs para casa. Por isso algumas vezes não há alternativa, senão a operação.
Distúrbios de adaptação como esse são bem mais frequentes nos bebês de parto cesariano. "Sabemos muito pouco por que é assim, até agora. Mas é fato que diversos processos ocorrem na criança, no parto normal, que não ocorrem durante uma cesariana. Entre outros, os pulmões."
De cortes acidentais até fraturas de braço, Van de Vondel já viu de tudo em recém-nascidos. "Obviamente essas lesões são raras. Entretanto, num parto vaginal, elas são ainda muito mais raras." Pois – ao contrário do que imaginam muitos progenitores, na cesárea o bebê não é retirado sem o menor esforço do útero.
Falta de pessoal e formação
A falta de pessoal especializado e disponível nas clínicas obstétricas é um fator que leva à preferência pela operação cesariana. Num comunicado, a Sociedade Alemã de Ginecologia e Obstetrícia confirma que "a falta de disponibilidade de uma medicina obstétrica com pleno pessoal e pronta para emergências [...] também determina uma decisão pela cesárea".
"Um atestado de pobreza", critica Van de Vondel – e isso precisa mudar. Na Clínica Feminina Porz am Rhein ela conseguiu reduzir o número de intervenções cesarianas em 15%, no prazo de dez anos, principalmente através de uma melhor formação dos obstetras e do aumento de pessoal.
"Em muitas clínicas, a obstetrícia ainda é uma coisa secundária, e consequentemente a formação é ruim nesse campo", diz. Em caso de dúvida, a cesariana é o caminho mais seguro para o profissional inexperiente. "Afinal, nenhum médico foi processado por ter executado uma cesariana desnecessária", comenta a ginecologista. Em caso contrário, a questão pode logo partir para a esfera jurídica.
"Tiraram algo de mim"
Sozinha, indefesa e desprotegida: muitas outras mulheres descrevem sua experiência na sala de parto. "Eu tinha desejado que fosse bem diferente", comenta Gülsah. E no entanto a cesariana costuma ser apenas o clímax de sua experiência traumática: a interferência violenta no processo de nascimento começa muito antes do corte no abdômen.
Em seu novo catálogo de diretrizes, a OMS aponta que no quotidiano clínico muitas vezes se esquece quão importante é, para mãe e criança, uma atmosfera respeitosa e afetuosa na sala de parto, e como pressão e intervenções desnecessárias podem ser danosos.
Isso é confirmado pela psicóloga Anette Paffrath, especializada em traumas de parto. Pacientes que se submeteram a uma cesárea a procuram com frequência particular: "O parto cesariano está associado à sensação de que 'tiraram alguma coisa de mim'", diz a psicóloga de Düsseldorf.
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