Há 15 anos, completou-se, após mais de 10 anos de trabalho e o investimento de cerca de US$ 30 bilhões, a sequência do genoma, que mudou para sempre a maneira como lidamos com nossa saúde.
7 mai 2018
08h27
Neste mês, completaram-se 15 anos desde a que a sequência completa do
genoma humano foi divulgada pela primeira vez, algo que deu início a uma
nova era para a medicina.
Dali em diante, a tecnologia acelerou significativamente o
sequenciamento genético e reduziu seu custo. Mas até que ponto os
avanços médicos tão esperados se materializaram?
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"Nós embarcamos em um dos capítulos mais emocionantes do livro da
vida", afirmou o professor Allan Bradley, diretor do Instituto Wellcome
Trust Sanger, ao celebrar o sucesso do Projeto Genoma Humano.
Completar o sequenciamento exigiu 10 anos de trabalho, e o investimento
de cerca de US$ 30 bilhões (R$ 106 bilhões). Agora, os avanços na
tecnologia dos computadores reduziram o custo desse trabalho para menos
de US$ 500 (cerca de R$ 1.773).
Uma empresa chamada Oxford Nanopore desenvolveu um leitor portátil,
pouco maior que um celular, para sequenciar o material genético em
questão de minutos.
O médico Gordon Sanghera, diretor executivo da empresa, falou sobre a
possibilidade de criar "a internet dos seres vivos, por meio de uma
conexão em tempo real com a informação do DNA", graças ao uso desse tipo
de dispositivo tecnológico. Segundo ele, as aplicações possíveis do
equipamento não se limitam à área da saúde.
Segundo Sanghera, esse leitor portátil também pode servir para
estabelecer a origem da comida de um restaurante, a presença de
micróbios perigosos em uma fábrica de processamento de alimentos ou em
fontes de água, por exemplo. Em outro campo, será possível utilizá-lo
para analisar vestígios de DNA em cenas de crimes.
"Este é o código de barras definitivo", reforça.
Um cabelo humano tem 10 mil vezes a espessura de um filamento de DNA,
mas o dispositivo portátil, chamado MiniON, consegue processá-lo por
meio de um minifuro - conhecido como nanoporo - e lê seus sinais
elétricos, que são instantaneamente convertidos em uma sequência.
Sanghera, cuja empresa captou mais de US$ 600 milhões em investimentos,
acredita que esse aparato poderia ser usado para diagnosticar infecções
comuns e, assim, reduzir as visitas desnecessárias ao médico e a
excessiva prescrição de antibióticos.
Ele garante que, durante a próxima década, será possível "sequenciar o
DNA de cada recém-nascido" - com isso, será possível saber se há
disposição genética do bebê para sofrer doenças e, como consequência
disso, medidas poderão ser tomadas para prevenir problemas advindos
delas.
Prevenção
A redução do custo levou a um rápido aumento do número de
sequenciamentos de DNA feitos. A Illumina, uma empresa que presta esse
tipo de serviços e está avaliada em US$ 35 bilhões no mercado de ações
americano, estima que mais de 500 mil genomas foram sequenciados em todo
o mundo.
Mas o que está provocando todo esse entusiasmo recente é a forma como
essa informação será combinada com outros dados e analisada
posteriormente.
Cientistas do Hospital BWH em Boston, nos EUA, usaram informações de um
banco genético para destacar o aumento do risco de desenvolver diabetes
tipo 2 entre as pessoas que trabalham em turnos diferentes do horário
tradicional, das 9h às 17h, como quem cobre horários rotativos ou
trabalha à noite, entre outros.
Tratamentos específicos
Em abril, o UK Biobank, repositório britânico de dados genéticos,
anunciou planos para fazer o sequenciamento do genoma completo de 50 mil
voluntários até 2019. O projeto será financiado com um fundo de US$ 41
milhões doado pelo Conselho de Pesquisa Médica e será levado adiante
pelo instituto Wellcome Sanger em Cambridge.
Um consórcio formado por várias empresas e liderado pela Regeneron
Pharmaceuticals já se comprometeu a ler e analisar os dados do exoma -
pequeno grupo de dados do genoma inteiro - dos voluntários. Cada empresa
investirá US$ 10 milhões no projeto.
Existem grandes esperanças de que essa informação genética analisada
por sistemas de inteligência artificial ajude a acelerar o diagnóstico
de câncer e leve a tratamentos mais específicos para combatê-lo.
A empresa suíça Sophia Genetics desenvolveu um sistema de inteligência
artificial que tem sido utilizado nos diagnósticos de 200 mil pacientes
em mais de 400 hospitais em 55 países.
"A Sophia Genetics tem a capacidade de abrir caminho para uma
inteligência coletiva que ajudará a diagnosticar e tratar cada paciente
de forma precisa e igualitária ao redor do mundo", afirma o médico Jurgi
Camblong, um dos fundadores da empresa.
Com esses sistemas, bilhões de dados serão analisados em poucos
minutos. Logo, os resultados serão refinados pela comunidade médica, o
que ajuda que o algoritmo fique ainda mais inteligente.
Além disso, as análises que normalmente precisavam de meses para serem feitas agora poderão estar prontas em questão de horas.
"Estamos entrando numa nova era em que seremos capazes de agrupar os
casos de pacientes com câncer e decidir se o câncer de um paciente
específico é parecido com o de outro dentro de um grupo de 10 mil
pacientes", explica Camblong.
Então, os médicos saberão qual tratamento funcionou melhor para esse tipo de pessoa com esse tipo de câncer.
Inteligência artificial
O desenvolvimento da inteligência artificial para a área de saúde teve
um novo impulso com o recebimento dos recursos da radiômica, a
capacidade de extrair informações úteis de imagens médica (os exames de
imagem como a ultrassonografia, a tomografia computadorizada ou a
ressonância magnética) - em casos de tumores, por exemplo.
Camblong reforça que se for possível prever como um tumor pode se
desenvolver, fica mais fácil entender como tratá-lo de maneira mais
efetiva.
"Estamos no início de uma revolução na medicina", afirma Ruth March,
vice-presidente e chefe de Medicina de Precisão e Genoma na empresa
farmacêutica AstraZeneca.
"Um número crescente de pacientes está sendo tratado com medicamentos
precisos devido à crescente compreensão sobre os impulsores genéticos da
doença. Os pacientes podem ser tratados com os remédios que têm maior
probabilidade de beneficiá-los", destaca.
Algumas empresas acreditam que o vínculo entre o genoma e a análise de
outros dados de saúde poderia ajudar as pessoas a viverem mais saudáveis
por mais tempo.
"Estamos combatendo a tradição médica em que esperamos as pessoas
ficarem doentes para depois tratá-las", afirmou o professor Craig
Venter, pioneiro no estudo do genoma humano e cofundador e diretor da
Human Longevity Inc (HLI), uma empresa dedicada a oferecer toda a
"inteligência médica derivada de análises de informação."
A HLI se uniu com a Amra, líder mundial em análise da composição
corporal, para combinar análise do genoma com perfil metabólico. O
objetivo é dar aos pacientes um conhecimento detalhado sobre suas
medidas de gordura e musculatura graças a um simples exame de seis
minutos.
Mas os avanços impressionantes da medicina têm sido mais difíceis de
serem alcançados do que muitos esperavam no início da era genômica.
"A finalização do projeto do genoma humano trouxe muita esperança sobre
a melhora na compreensão e no tratamento de doenças. Mas como sempre,
subestimamos a complexa relação entre o genoma, a doença e a saúde",
conclui Laxmi Parida, da IBM.
Então, ainda que isso seja só o início, na era do genoma, o cuidado da saúde está mudando de maneira definitiva.
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