A chamada Teoria Monetária Moderna, que rege a economia do Japão, afirma que um país que controla a própria moeda seria incapaz de quebrar; economistas classificam-na como um risco
Ben Dooley, The New York Times
28 de junho de 2019
TÓQUIO
- Gastar bastante sem se preocupar com o déficit. Esse é o caminho para
a prosperidade proposto pelos defensores da Teoria Monetária Moderna,
um nada ortodoxo conjunto de ideias econômicas. A prova do seu
funcionamento seria o Japão. Apesar de ter a maior dívida do mundo
desenvolvido, o Japão continua sendo uma potência econômica, com alto
padrão de vida. Mas Shinzo Abe, primeiro-ministro japonês, descartou a
teoria, descrevendo-a como "simplista". O ministro das Finanças, Taro
Aso, descreveu-a como “muito perigosa". E Haruhiko Kuroda, diretor do
banco central japonês, a chamou de “extrema".
Legisladores à
esquerda de Abe estão citando a teoria - conhecida como MMT - para
denunciar seu plano de aumentar os impostos para os consumidores do
país. À direita, membros do seu próprio partido tentaram associar as
políticas dele à teoria, acusando-o de acumular uma dívida imensa que o
país jamais poderá quitar (no momento, o endividamento do Japão é quase
250% da sua produção econômica anual).
Quer Abe goste ou
não, o Japão é uma peça importante em um quebra-cabeça global que a
Teoria Monetária Moderna pretende solucionar. De acordo com os manuais
de economia, quando os déficits aumentam, a inflação e os juros devem
acompanhar esse crescimento.
Não foi o que ocorreu em países
como os Estados Unidos, que acumularam um imenso endividamento do
governo após a crise financeira global de 2008. Em vez disso, os preços e
o custo do crédito permaneceram baixos. Os defensores da Teoria
Monetária Moderna dizem que os déficits são algo positivo, desde que o
governo não gere inflação ao impulsionar a economia rápido demais.
A
ideia atraiu críticas de economistas renomados como Paul Krugman,
ganhador do Prêmio Nobel e colunista do New York Times, bem como
Lawrence Summers, ex-secretário do tesouro dos EUA. Para eles, os gastos
do governo podem ser necessários em momentos de dificuldade. Mas, um
dia, a conta chega. Enquanto isso, todos esses gastos podem sufocar o
setor privado e dificultar a obtenção de empréstimos por parte do
governo sob a forma de obrigações.
A teoria sustenta que um país
capaz de controlar a própria moeda, como é o caso de EUA e Japão, seria
incapaz de quebrar, independentemente do quanto se endivide. O gasto por
parte do governo coloca dinheiro na mão das pessoas e das empresas. Em
outras palavras, um déficit do governo é, na prática, um superávit para o
setor privado. De acordo com a teoria, para estimular o crescimento, os
governos devem acumular déficits para dar aos consumidores e empresas
mais dinheiro para gastar. Se os líderes precisarem de mais dinheiro,
basta imprimi-lo.
Foi basicamente isso que o Japão fez nos 20
anos mais recentes. Sua economia prosperou após a 2ª Guerra Mundial.
Então, os empolgantes anos 1980 chegaram ao fim com uma quebra. A
economia estagnou. A deflação derrubou os preços e os lucros
corporativos. O Japão tomou empréstimos e gastou para fazer com que o
crescimento voltasse. Ainda assim, a inflação não foi afetada. Os juros
permaneceram baixos.
O Japão se aprofundou ainda mais em
políticas como a MMT após a eleição de Abe como primeiro-ministro em
2012. O plano dele, apelidado de Abenomics, previa mais gastos em
projetos públicos e uma política monetária relaxada. Mas, depois da
eleição, Abe prometeu encontrar uma forma de quitar a dívida acumulada
durante o seu governo.
Abe disse que vai elevar o imposto sobre
bens de consumo no Japão de 8% para 10% já em outubro. A promessa
enfrenta oposição de legisladores da esquerda e da direita. Um aumento
semelhante nos impostos em 2014 pode ter empurrado a economia japonesa,
de crescimento já lento, para uma recessão. Dessa vez, a economia já foi
enfraquecida pela desaceleração na demanda chinesa por seus produtos.
Muitos
no partido de Abe também são contrários ao aumento nos impostos,
dizendo que o governo deve lidar com o problema dos déficits depois que
as condições econômicas do Japão tiverem melhorado e o país possa
suportar melhor o choque. Enquanto isso, eles temem que, se o Japão
seguir acumulando dívidas, será cada vez mais difícil sair do buraco
cavado.
“Uma quebra deve ocorrer em algum momento", disse Kohei
Otsuka, membro da oposição na câmara superior, “e então veremos que não
havia nenhum mérito nas ideias da MMT". / Hisako Ueno contribuiu com a reportagem. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL
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