BRASIL
Setor econômico apostou na vitória do candidato do PSL no segundo turno da eleição. Mas o próximo presidente está diante de grandes desafios. E não se sabe como ele quer solucioná-los.
Desde meados de setembro, o humor na economia brasileira melhorou muito – exatamente no momento em que aumentaram as perspectivas de Jair Bolsonaro se tornar presidente da República.
No início de outubro, quando ele quase venceu já no primeiro turno, o mercado financeiro festejou: em seis semanas, o dólar perdeu 13% do valor frente ao real. No mesmo período, o Ibovespa cresceu 14%. Os juros de longo prazo do Brasil caíram. E as vendas na bolsa alcançaram recordes históricos.
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A mudança no clima entre os investidores também se deve ao fato de que, simultaneamente ao aumento da popularidade de Bolsonaro, aconteceu uma abrangente guinada à direita na política brasileira. Nas eleições para o Congresso e para os governos estaduais, candidatos de direita obtiveram vitórias surpreendentemente vigorosas.
O PSL, até então insignificante, agora é a segunda maior força política na Câmara dos Deputados. "Com isso, aumentaram as chances de Bolsonaro poder introduzir uma agenda liberal de reformas, com resistência menor no Legislativo", comenta Marcelo Giufrida, da empresa de gestão de recursos Garde Asset Management.
A confiança em Bolsonaro surpreende, já que não está claro como o militar da reserva quer solucionar os graves problemas econômicos do Brasil. Nos quase 30 anos em que atuou na política, sem cargo executivo, Bolsonaro chamou a atenção sobretudo por suas declarações racistas, homofóbicas, misóginas e de exaltação da violência.
Mas, durante a campanha eleitoral, ele de repente saiu do armário como um reformista neoliberal. Para isso, chamou para conselheiro econômico o banqueiro e multimilionário Paulo Guedes, um economista de 69 anos que deverá se tornar seu superministro da Fazenda. Mas Guedes nunca administrou um ministério ou negociou com o Congresso.
Mesmo assim, ele planeja amplas reformas: quer vender todas as empresas estatais e, assim, liquidar a dívida do Estado. A Previdência Social, que é um regime de repartição no qual as contribuições obrigatórias da geração na ativa alimentam diretamente as aposentadorias das pessoas que já se aposentaram, deverá ser alterada para o regime de capitalização, que segue o princípio de acúmulo de um estoque de capital individual. Essa arrecadação depois serve para financiar as aposentadorias desses mesmos trabalhadores.
Hoje não é mais possível financiar o sistema previdenciário brasileiro. Em cinco anos, seria necessário todo o orçamento do Estado para pagar as aposentadorias.
Mas, depois da apresentação dessa proposta, Bolsonaro recuou e silenciou Guedes. O presidenciável disse que pretende excluir as principais estatais, como a Petrobras e o Banco do Brasil, das privatizações.
O ex-capitão do Exército também quer manter os privilégios dos militares, que, tanto quanto os funcionários públicos, oneram o sistema previdenciário num nível acima da média e às custas da população.
A ampla abertura do mercado brasileiro às importações também já encontra resistência na indústria. "As chances de as propostas de Guedes serem concretizadas assim como estão tendem a zero", diz o economista Pérsio Arida, ex-presidente do Banco Central e do BNDES e que tem vasta experiência no setor público.
O fato de Bolsonaro ter votado a favor principalmente dos interesses dos consórcios estatais, funcionários públicos e militares durante sua longa atuação como deputado federal também faz com que investidores estrangeiros desconfiem de sua capacidade de realizar reformas.
A agência de classificação de risco Standard & Poor's afirmou que Bolsonaro é um risco maior para a economia do que seu opositor na eleição, Fernando Haddad. Como outsider político, Bolsonaro teria mais problemas de concretizar seu programa econômico. Já outra agência, a Moody's, teme que a polarização crescente no Congresso dificulte a realização de reformas e a criação da base para um crescimento sustentável pelo próximo presidente.
Porém, apesar das dúvidas em relação a Bolsonaro, a euforia dos investidores foi impulsionada sobretudo conforme caíam as chances de o candidato da esquerda e o PT assumirem o poder. Para a economia, o petista oferecia receitas velhas, com as quais o partido mergulhou o país na recessão e na lama de corrupção. Haddad queria até reverter as poucas reformas realizadas nos últimos dois anos. "Apesar de suas opiniões populistas e antidemocráticas, Bolsonaro era a opção amigável aos mercados", afirma o analista Marcos Casarin, da Oxford Economics.
Para Arthur Carvalho, do banco de investimentos Morgan Stanley, a questão decisiva agora é: "O próximo presidente está disposto a assumir os custos políticos de um saneamento do orçamento?" É que o Brasil ruma para uma crise financeira. O país deverá encerrar 2018 com um deficit público de 7,6% do desempenho econômico (PIB).
A taxa é maior do que a da vizinha Argentina, que, em poucos meses, passou de estrela dos países emergentes a pedinte junto ao Fundo Monetário Internacional (FMI). Especialistas do banco de investimentos JP Morgan alertam que o Brasil tem o maior deficit público do mundo. A dívida pública soma quase 80% do PIB. "Ou o próximo governo realiza voluntariamente um saneamento das contas públicas, ou um crash no Brasil vai obrigá-lo a fazer", afirma Carvalho.
Bolsonaro precisa apresentar logo reformas convincentes se quiser diminuir a dívida pública, diz o JP Morgan. Ele não tem muito tempo. "Os mercados não vão dar mais voto de confiança ao próximo presidente", dizem especialistas do banco.
Há quase quatro anos, a economia brasileira flutua mais ou menos sem comando. Depois de três anos de recessão, ela voltou a estagnar. Cerca de 13 milhões de brasileiros estão desempregados, e o dobro está no subemprego. Cada vez mais, a oitava maior economia do mundo está perdendo a ligação com a economia mundial. Sua infraestrutura e o sistema educacional estão piorando velozmente. De forma desoladora, a indústria do país acaba ficando para trás em temas como digitalização, indústria 4.0, big data e inteligência artificial. E o Estado é extremamente ineficiente.
Nas últimas semanas foram publicados novos dados decepcionantes sobre a posição do Brasil na economia mundial. Um exemplo é a queda dos investimentos estrangeiros, segundo levantamento feito pela Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD). Com um decréscimo de 22% no primeiro semestre, o Brasil registrou o maior declínio entre os países sul-americanos, diz o estudo.
Outro exemplo é a perda de competitividade do Brasil como sede de empresas segundo ranking do Fórum Econômico Mundial, segundo o qual, desde 2014, o país escorregou da 57ª para a 72ª posição entre 140 países.
Ainda assim, o Brasil não é um caso sem esperança. É que, rapidamente, um presidente poderia alavancar uma evolução positiva – com os sinais certos. E, logo, colher os frutos de uma política de reformas. É que, diferentemente da Argentina, visto de fora, o Brasil parece sólido: com a entrada de dólares, os setores da agricultura e da mineração compensam amplamente a balança corrente e enchem os caixas de divisas.
O Brasil é pouco endividado no exterior. Por isso, o Banco Central consegue manter os juros em níveis historicamente baixos, e a inflação está sob controle. A conjuntura brasileira poderia acelerar rapidamente se o humor geral na economia virar para o lado positivo.
"Se o próximo presidente usar o impulso político de sua vitória eleitoral", diz Edson Franco, da seguradora Zurich, "há boas chances de que o Brasil passará por quatro bons anos."
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