Juízes trabalhistas têm
condenado por litigância de má-fé partes e advogados que exageram ou
inventam verbas trabalhistas em processos. Além da multa, os casos estão
sendo encaminhados para a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) para a
abertura de processos disciplinares contra profissionais que instruem
clientes a mentir.
Em um julgamento ocorrido recentemente
em Mauá (SP), a juíza Meire Iwai Sakata descobriu por acaso que um
trabalhador não fazia horas extras, apesar de solicitadas no processo.
Como o advogado faltou na audiência, a magistrada resolveu inquirir o
autor e foi surpreendida com a resposta. O trabalhador foi categórico ao
afirmar que não estendia a sua jornada. A juíza ainda perguntou se o
seu advogado sabia do fato e ele disse que o profissional foi informado
sobre seus horários.
Como o trabalhador foi sincero, a juíza
decidiu não condená-lo por litigância de má-fé – embora tenha em outros
processos aplicado a punição. No caso, apenas encaminhou ofício à OAB
com cópia da petição inicial, da ata da audiência, realizada no dia 1º
de junho, e da sentença. “Por não se tratar de má-fé do empregado, tanto
é que foi sincero em depoimento, não é justo lhe condenar em litigância
de má-fé por ato de seu advogado”, diz a magistrada na decisão.
De acordo com a sentença, “o advogado,
profissional que merece o profundo respeito do Poder Judiciário e que é
indispensável à administração da Justiça (artigo 133 da Constituição
Federal), deve primar pelo conteúdo ético do processo. Não deve proceder
de forma temerária, tumultuando o processo, visando obter vantagens,
alterando a verdade dos fatos”.
Em entrevista ao Valor, a juíza Meire
Iwai Sakata, afirma que tem procedido dessa forma quando entende que
existe abuso por parte do advogado. “Estou na magistratura há mais de
duas décadas e costumo ser rigorosa quando vejo que houve falta de
conteúdo ético”, diz. “Quando eu vejo exageros do trabalhador, condeno
no processo por litigância de má-fé.”
O advogado trabalhista que representa a
companhia no processo, Eduardo Máximo Patrício, do escritório GMP
Advogados, afirma que se essa iniciativa da juíza se tornasse mais
comum, evitaria tantos abusos em reclamações trabalhistas. “A máxima no
direito trabalhista é pedir tudo para ver depois o que se ganha,
exatamente porque talvez falte punir os pedidos absurdos”, diz
De acordo com o advogado, tem sido mais
comum condenar o reclamante por litigância de má- fé. Porém, no caso, a
juíza entendeu que a ma-fé ocorreu por parte do advogado e, assim, o
trabalhador não deveria ser punido pela Justiça.
Em Salvador, um advogado e a
trabalhadora que ajuizou a ação foram condenados a pagar cada um, a
título de indenização à parte contrária, 20% do valor arbitrado por
litigância de má-fé. A decisão é da juíza do trabalho substituta Viviane
Christine Martins Ferreira Habib, da 36ª Vara do Trabalho.
De acordo com o processo, o advogado
teria criado um “roteiro de respostas” para as testemunhas, utilizado em
diversos processos em varas diferentes da capital baiana.
No caso, a magistrada concluiu pela
condenação do advogado por ter exposto “em juízo fatos sabidamente
inverídicos e porque participou ativamente da tentativa de
enriquecimento ilícito”. A juíza determinou ainda a expedição de cópia
da sentença e da petição inicial à OAB, para a adoção das medidas
disciplinares pertinentes.
O juiz trabalhista Maurício Pereira
Simões, que atua há nove anos em São Paulo e advogou por sete anos, diz
que “a sensação é que na Justiça do Trabalho as partes, tanto do
empregado quanto do empregador, podem mentir a qualquer tempo”. Segundo
ele, muitas vezes o advogado aumenta um fato para ter maiores chances de
ganhar o processo. “Existe uma sensação de impunidade, de vale tudo,
porque no fim das contas, o que vale é o dinheiro.”
Um dos pontos que costuma dar grande
divergência nas versões apresentadas, segundo o magistrado, está nos
pedidos que tratam do horário de almoço. “O advogado de trabalhador diz
que ele tinha dez minutos para almoçar e do empregador que tinha uma
hora e meia. Os dois exageram”, afirma.
Esses exageros fazem parte do dia a dia
do juiz do trabalho, segundo Simões. “Passamos de 70% a 80% do tempo
tentando descobrir a verdade no processo. Aplicar o direito tem sido bem
menos complexo”, diz. Para tentar descobrir os fatos, o magistrado
tenta, segundo ele, fazer perguntas paralelas, que fogem dos “roteiros”
preparados por alguns advogados para localizar as contradições.
Com o novo Código de Processo Civil
(CPC), essa “investigação do juiz” ganhou reforço, de acordo com Simões,
já que permite que o magistrado possa definir qual das partes deverá
fazer a prova, o que pode facilitar a busca pela verdade.
O advogado trabalhista Túlio Massoni,
sócio do escritório Romar, Massoni e Lobo Advogados, acredita que o novo
CPC possa dar subsídios a mais aos processos trabalhistas para coibir
exageros nos depoimentos. Para ele, é prudente que o advogado peça que o
seu cliente assine a ficha de entrevista realizada por ele, para se
certificar de que a versão apresentada foi fiel ao que foi pedido no
processo.
Fonte: Valor Econômico, por Adriana Aguiar, 20.0
Nenhum comentário:
Postar um comentário