Para conseguir aprovar a proposta, relator negociou mudanças como deixar irrestrita a adesão à declaração simplificada e a ampliação de incentivos fiscais; placar foi de 398 votos favoráveis a 77 contrários
01 de setembro de 2021 | 19h17
Atualizado 02 de setembro de 2021 | 00h34
BRASÍLIA - Com apoio dos partidos de oposição, o presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-AL), conseguiu a aprovação, por 398 a 77, do texto-base da reforma que altera o Imposto de Renda para pessoas físicas, empresas e investimentos. Para conseguir o aval dos deputados, o texto foi modificado para deixar de fora a restrição do acesso à declaração simplificada. Além disso, o parecer aprovado amplia incentivos fiscais para setores específicos.
Depois de três tentativas frustradas, Lira usou o rolo compressor e surpreendeu na hora da votação, patrocinando o acordo com os partidos da oposição, capitaneados pelo PT, mas com apoio até mesmo do PSOL. Novas concessões foram feitas, com redução da arrecadação federal, sem que cálculos tenham sido apresentados pela equipe econômica. A votação começou sem que os parlamentares tivessem acesso ao texto final.
O acordo não obteve, porém, a anuência de toda a oposição. Alguns deputados veem como um erro dar uma vitória para o projeto do governo Bolsonaro às vésperas das manifestações do feriado da Independência de 7 de setembro. O discurso acordado para a votação foi de que não se tratava mais de um projeto do governo Bolsonaro e do ministro da Economia, Paulo Guedes, mas da Câmara. Os deputados ainda vão analisar nesta quinta-feira, 2, 26 sugestões de alteração do texto-base, chamadas de destaques. Depois, a reforma segue para o Senado.
Mudanças para pessoas físicas
Para atender os partidos de oposição, o relator do projeto, deputado Celso Sabino (PSDB-PA), propôs retirar a restrição ao uso do desconto simplificado na tabela do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF). Os contribuintes que optam pela simplificada podem abater 20% do imposto sobre a soma dos rendimentos tributados. No projeto inicial, enviado pelo governo, só os contribuintes com renda anual de R$ 40 mil (pouco mais de R$ 3 mil por mês) poderiam aderir à modalidade. Com o acordo, esse limite caiu.
Além disso, o desconto máximo na declaração do IR (que hoje é de R$ 16.75,34) caiu para R$ 10.563,60 pelo texto-base aprovado pelos deputados. O governo queria uma redução maior, para R$ 8 ml.
Outra alteração é a ampliação da faixa de isenção da tabela do IR, que passa a ser para todos os contribuintes que ganham até R$ 2,5 mil (hoje, esse limite é de R$ 1,9 mil). Os valores das demais faixas do IR também serão reajustados, em menor proporção. Segundo o governo, a atualização vai isentar 5,6 milhões de novos contribuintes. Com isso, os isentos passariam dos atuais 10,7 milhões para 16,3 milhões. Já os demais trabalhadores com carteira de trabalho assinada terão um desconto menor no contracheque.
Mudanças para empresas
Sem citar em plenário, o relator fez mudanças na redução da alíquota do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ). Ele apresentou cinco versões do parecer. Na última, protocolada nesta quarta-feira, 01, prevê uma redução de 15% para 8% da alíquota-base do IRPJ (portanto, de sete pontos porcentuais). A alíquota adicional fica mantida em 10%. Dessa forma, a alíquota do IPRJ cairá dos atuais 25% para 18%.
O texto aprovado ainda prevê uma redução adicional da carga tributária das empresas por meio da diminuição das alíquotas da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) em até um ponto procentual. Mas essa queda está condicionada à revogação de benefícios fiscais do PIS/PASEP e da COFINS destinados a setores específicos.
No último parecer antes da votação, a redução do IRPJ era mais agressiva, de 8,5 pontos porcentuais, passando de 25% para 16,5%. A CSLL cairia 1,5 ponto porcentual. Ele mudou de ideia para angariar apoio de governadores e prefeitos, que alegam perda de recursos com a reforma, já que a arrecadação do Imposto de Renda das empresas é compartilhada com Estados e municípios, e a da CSLL, não. Com esses cortes, a carga tributária cobrada das empresas deve cair dos atuais 34% para 26% (sete pontos porcentuais do IR e um ponto porcentual da CSLL).
Sabino afirmou que não haverá perda alguma para os cofres de Estados e municípios, mas não explicou como. O Estadão apurou que o acordo envolve a aprovação de uma proposta para os municípios parcelarem as dívidas previdenciárias e ganharem alívio de R$ 31 bilhões.
Lucros e dividendos
Sem dar detalhes, Sabino informou que manteve a taxação sobre a distribuição de lucros e dividendos como estava no seu parecer, em 20%. Atualmente, não é cobrado imposto sobre esse tipo de remuneração a acionistas. Parlamentares que participaram das negociações finais informaram que há um destaque (sugestão de mudança) ao parecer para aprovação de uma alíquota menor, de 15%.
Ficam isentos da cobrança os lucros e dividendos distribuídos por empresas que estão no Simples Nacional e por empresas optantes do regime de lucro presumido que faturam até R$ 4,8 milhões.
Dividendos até R$ 20 mil distribuídos por pequenos negócios e os distribuídos entre integrantes do mesmo grupo econômico também permanecem isentos de cobrança.
Sabino também manteve o fim do chamado Juros de Capital Próprio (JCP), mecanismo usado pelas grandes empresas para remunerar os seus acionistas com a possibilidade de deduzir essa despesa do imposto a pagar. Essa era também uma bandeira da oposição, mas que já estava no último parecer.
O líder do governo, Ricardo Barros (Progressistas-PR), fez um compromisso de que não haverá vetos do presidente à taxação na distribuição de lucros e dividendos, isenta desde 1995, e nem ao fim do JCP. Se houver vetos, por razão jurídicas, o líder disse que será feito acordo para derrubar o veto.
'Ajustes finos'
Sabino informou que fez "ajustes finos" para atender o setor agropecuário e manteve a possibilidade de dedução do que as empresas gastam no chamado PAT (vale-alimentação e vale-refeição dos funcionários).
Na contramão do que pretendia a equipe econômica, Sabino ampliou as isenções do Imposto de Renda. Sem falar claramente em valores, ele informou que “multiplicou” o porcentual de dedução das doações, gastos e patrocínios com cultura (Lei Rouanet), obras audiovisuais, incentivo ao esporte e fundos de apoio à criança, ao adolescente e de amparo ao idoso. Essa seria uma forma, segundo a oposição, de esses incentivos não serem prejudicados pela redução da alíquota base do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ).
O acordo também prevê a prorrogação por mais cinco anos da dedução das doações e patrocínios ao Pronan e Pronas, programas de incentivos voltados para atendimento de pessoas com câncer e com deficiência. Segundo Sabino, a medida atende entidades filantrópicas que atuam no apoio ao tratamento do câncer. Esses incentivos seriam encerrados ao final de 2021. Também foram prorrogados incentivos ao esporte, que seriam encerrados no final de 2022.
“Acabamos de participar de uma Olimpíada onde vários jovens, atletas que participaram receberam incentivo, receberam patrocínio através da lei de apoio ao esporte”, disse Sabino. Segundo ele, a Lei de Incentivo ao Esporte permite que as empresas possam doar até 1% do seu imposto de renda para essas entidades.
Num tom ufanista, o relator disse que votar a favor do projeto é votar a favor das empregadas domésticas, dos professores e de todos os contribuintes que pagarão menos imposto.
Embora inicialmente Sabino tivesse encerrado a desoneração de embarcações, aeronaves e suas partes e peças, no texto aprovado o benefício fiscal permanece em vigor.
A versão aprovada também aumenta de 4% para 5,5% a alíquota sobre ferro, cobre, bauxita, ouro, manganês, caulim e níquel da Compensação Financeira por Exploração Mineral (CFEM), cobrada por uma autarquia do Ministério de Minas e Energia. Ainda, inclui o nióbio e o lítio no rol desses minérios.
Originalmente, o relator havia sugerido repassar a parte da União na arrecadação para Estados e municípios, a fim de compensar as perdas na arrecadação com o IRPJ. Entretanto, o texto aprovado mantém a fatia com a União.
Elogios
Sabino foi muito elogiado pela oposição, que não ouviu muitos especialistas ligados à esquerda que apresentavam restrições ao texto por aumentar ainda mais a chamada regressividade do sistema tributário, quando os ricos pagam proporcionalmente menos impostos. O texto manteve, por exemplo, incentivos à chamada pejotização, quando profissionais liberais (como advogados, médicos, economistas e contadores) atuam como pessoa jurídica (PJ) para pagar menos impostos.
“Eu quero aqui, publicamente, elogiar relator pela integridade com que conduziu esse debate difícil. Esse é um tema que está longe de um acordo imediato. Os interesses contrários são muito fortes”, disse o deputado Marcelo Freixo (PSOL-RJ), líder da minoria.
“Até 2015, nos governos do PT, a revisão da tabela era feita acima da inflação e, desde 2015, apesar de o presidente Bolsonaro ter dito que faria uma faixa de isenção de R$ 5 mil, nós não temos revisão da tabela do Imposto de Renda. O projeto faz essa revisão”, disse o líder do PT, Afonso Florence (PT-BA).
Críticos do atropelo da tramitação alertaram que uma votação dessa forma é inconstitucional por violação ao devido processo legislativo. A equipe econômica passou ao largo dessas negociações e cálculos não foram apresentados.
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Reforma do Imposto de Renda: o que muda com o texto-base do projeto aprovado na Câmara
Câmara fez mudanças de última hora para ter apoio da oposição e aprovar o projeto; saiba o que muda no Imposto de Renda para pessoas e empresas e como fica a declaração simplificada
01 de setembro de 2021 | 23h28
BRASÍLIA - Por 398 votos a 77, a Câmara dos Deputados aprovou na noite de quarta-feira (1º) o texto-base da reforma do Imposto de Renda (IR) de pessoas físicas, empresas e os investimentos. A sessão foi encerrada antes da análise dos chamados destaques (sugestões de alteração na matéria), que podem ser votados nesta quinta, 2. Depois, a reforma segue para o Senado.
Para conseguir o aval dos deputados, o texto foi modificado para deixar de fora a restrição do acesso à declaração simplificada. Além disso, o parecer aprovado amplia incentivos fiscais para setores específicos.
Depois de três tentativas frustradas para votar o projeto, o presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-AL), usou o rolo compressor e surpreendeu na hora da votação, patrocinando o acordo com os partidos da oposição, capitaneados pelo PT, mas com apoio até mesmo do PSOL. Novas concessões foram feitas, com redução da arrecadação federal, sem que cálculos tenham sido apresentados pela equipe econômica.
Veja o que muda com a reforma do Imposto de Renda:
Imposto de Renda Pessoa FísicaA faixa de isenção sobe de R$ 1.903,98 para R$ 2,5 mil, uma correção de 31%. Com isso, mais de 5,6 milhões passarão a ser considerados isentos. As demais faixas do IR também foram ajustadas, mas em menor proporção (cerca de 13%).
Desconto simplificado na declaração do IR:
- Pelas regras atuais, todas as pessoas físicas podem optar por esse desconto, e o abatimento é limitado a R$ 16.754,34. Pela proposta inicial, somente quem tem renda abaixo de R$ 40 mil por ano (pouco mais de R$ 3 mil por mês) poderia optar pelo desconto simplificado na declaração anual do IR — que estaria limitado a R$ 8 mil. O projeto aprovado libera o uso do simplificado todos os contribuintes. O desconto simplificado caiu do teto de 16.754,34 para 10.563,60.
Ganhos de capital com imóveis:
- O governo propôs reduzir a alíquota do Imposto de Renda (IR) sobre ganhos de capital na venda de imóveis para 4% se o contribuinte atualizar o valor da propriedade.
- Pelas regras atuais, a alíquota do IR sobre ganhos de capital é de 15% e 22,5% e a incidência ocorre quando o contribuinte vende ou transfere a posse do imóvel.
- O prazo para atualizar o valor do imóvel, e pagar uma alíquota menor, pela proposta do governo, será de janeiro a abril de 2022.
Imposto de Renda para empresas:
- Guedes propôs a redução da alíquota, que atualmente é de 15%. A proposta era de que o valor caísse em 2,5 pontos percentuais em 2022 (para 12,5%) e mais 2,5 pontos percentuais a partir de 2023, chegando a 10%.
- O relator chegou a propor uma queda de 12,5 pontos porcentuais, mas, entre idas e vindas, a queda ficou mais tímida. O corte ficou em 7 pontos porcentuais, com a diminuição de 15% para 8% da alíquota-base do IRPJ. A alíquota adicional fica mantida em 10%. Dessa forma, a alíquota do IRPJ cairá dos atuais 25% para 18%.
- A alíquota da CSLL (hoje são de três tipos: 9%, 15% e 20%) cai até um ponto porcentual. Mas essa queda está condicionada à revogação de benefícios fiscais do PIS/PASEP e da COFINS destinados a setores específicos
Lucros e dividendos:
- O governo propôs o retorno da tributação sobre a distribuição de lucros e dividendos das empresas a pessoas físicas, que vigorou até 1995. Atualmente, não há cobrança.
- O projeto aprovado prevê uma alíquota de 20% na fonte. Mas os deputados ainda vão votar uma sugestão de mudança e devem derrubar a alíquota para 15%. Empresas do Simples e do lucro presumido (muito usado por profissionais liberais) com faturamento de até R$ 4,8 milhões por ano permanecem isentas.
Juros sobre capital próprio:
- A proposta ainda prevê o fim dos juros sobre capital próprio, que consiste na distribuição dos lucros de uma empresa de capital aberto (que tem ações na Bolsa) aos seus acionistas. Atualmente, as empresas são isentas e há incidência do IR de 15% quando os recursos são depositados nas contas dos acionistas.
Cortes de benefícios fiscais:
- Para compensar a perda de arrecadação com a redução do imposto das empresas, o relator propôs cortar alguns benefícios: isenção de IR sobre auxílio-moradia de agentes públicos; crédito presumido aos produtores e importadores de medicamentos; redução a zero das alíquotas de determinados produtos químicos e farmacêuticos; desoneração para termelétricas à gás natural e carvão mineral.
- Embora inicialmente Sabino tivesse encerrado a desoneração de embarcações, aeronaves e suas partes e peças, no texto aprovado o benefício fiscal permanece em vigor.
Royalties de mineração:
- A versão aprovada também aumenta de 4% para 5,5% a alíquota sobre ferro, cobre, bauxita, ouro, manganês, caulim e níquel da Compensação Financeira por Exploração Mineral (CFEM), cobrada por uma autarquia do Ministério de Minas e Energia. Ainda, inclui o nióbio e o lítio no rol desses minérios.
- Originalmente, o relator havia sugerido repassar a parte da União na arrecadação para Estados e municípios, a fim de compensar as perdas na arrecadação com o IRPJ. Entretanto, o texto aprovado mantém a fatia com a União.
Benefícios estendidos:
- Como parte do acordo com partidos da oposição, foi mantida a dedução de doações para os Fundos do Idoso e da Criança e do Adolescente, em favor de projetos desportivos e paradesportivos, de projetos culturais, de obras audiovisuais brasileiras de produção independente e de serviços e ações do Programa Nacional de Apoio à Atenção Oncológica (Pronon) e do Programa Nacional de Apoio à Atenção da Saúde da Pessoa com Deficiência (Pronas/PCD).
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