Homens e mulheres com mais de 60 anos que caminharam por 6 meses mostraram melhorias na substância branca do cérebro e na memória
09 de agosto de 2021 | 05h00
Exercitar-se pode refrescar e renovar a substância branca em nossos cérebros, melhorando potencialmente nossa capacidade de pensar e de memória conforme envelhecemos, de acordo com um novo estudo sobre caminhada, dança e saúde cerebral. A pesquisa mostra que a substância branca, que conecta e sustenta as células em nossos cérebros, remodela a si mesma quando as pessoas se tornam mais ativas fisicamente. Por outro lado, entre aqueles que permanecem sedentários, a substância branca tende a se desgastar e encolher.
As descobertas destacam o dinamismo de nossos cérebros e como eles se transformam constantemente - para o bem e para o mal - em resposta a como vivemos e nos movimentamos.
A noção de que cérebros adultos podem ser maleáveis é uma descoberta razoavelmente recente, em termos científicos. Até o final da década de 90, a maioria dos pesquisadores acreditava que os cérebros humanos eram fisicamente fixos e inflexíveis depois da primeira infância. Acreditava-se que nascíamos com a maioria das células cerebrais que teríamos durante a vida e que não poderíamos produzir outras mais. Nesse cenário, a estrutura e a função de nossos cérebros só diminuiriam com a idade.
Mas a ciência avançou, felizmente, e revisou aquela previsão tenebrosa. Estudos complexos usando corantes especializados para identificar células recém-nascidas indicaram que algumas partes de nossos cérebros criam neurônios na idade adulta, um processo conhecido como neurogênese. Estudos de acompanhamento comprovaram que o exercício aumenta a neurogênese. Quando os roedores correm, por exemplo, eles produzem três ou quatro vezes mais células cerebrais novas do que os animais inativos, enquanto nas pessoas, começar um programa de exercícios regulares leva a um maior volume cerebral. Em suma, esta pesquisa mostra que nossos cérebros conservam a plasticidade ao longo da vida, mudando conforme mudamos, inclusive em resposta à forma como nos exercitamos.
No entanto, aqueles estudos anteriores em relação à plasticidade do cérebro geralmente se concentravam na matéria cinzenta, que contém as famosas pequenas células cinzentas, ou neurônios, que permitem e criam pensamentos e memórias. Menos pesquisas têm examinado a substância branca, a "fiação" do cérebro. Composta principalmente por fibras nervosas envoltas em gordura conhecidas como axônios, a substância branca conecta os neurônios e é essencial para a saúde do cérebro. Mas pode ser frágil, escassa e desenvolver pequenas lesões à medida que envelhecemos; degradações que podem ser precursoras do declínio cognitivo. De forma preocupante, ela também tem sido considerada relativamente estática, com pouca plasticidade ou capacidade de se adaptar muito conforme nossas vidas mudam.
Mas Agnieszka Burzynska, professora de neurociência e desenvolvimento humano na Universidade do Estado do Colorado em Fort Collins, suspeitou que a ciência estava subestimando a substância branca. “Ela tem sido como a meia-irmã feia e negligenciada” da matéria cinzenta, ignorada e julgada mal, disse. Agnieszka considerou provável que a substância branca possuísse tanta plasticidade quanto sua equivalente cinzenta e pudesse remodelar a si mesma, principalmente se as pessoas começassem a se movimentar.
Então, para o novo estudo, que foi publicado on-line em junho na revista acadêmica NeuroImage, ela e a estudante de pós-graduação Andrea Mendez Colmenares e outros colegas começaram a analisar a substância branca das pessoas. Eles deram início ao estudo reunindo quase 250 homens e mulheres mais velhos que eram sedentários, mas saudáveis. No laboratório, testaram o condicionamento aeróbico e as habilidades cognitivas atuais desses voluntários e também avaliaram a saúde e o funcionamento da substância branca deles, usando uma forma sofisticada de ressonância magnética para examinar o cérebro.
Em seguida, eles dividiram os voluntários em grupos, um dos quais começou um programa supervisionado de alongamento e treinamento de equilíbrio três vezes por semana, para servir de controle ativo. Outro grupo começou a caminhar em grupo três vezes por semana, rapidamente, por cerca de 40 minutos. E o último grupo começou a dançar, reunindo-se três vezes por semana para aprender e praticar coreografias em conjunto. Todos os grupos se exercitaram por seis meses e depois voltaram ao laboratório para repetir os exames do início do estudo.
E, para muitos, seus corpos e cérebros tinham mudado, descobriram os cientistas. Aqueles que caminharam e praticaram dança estavam com melhor condicionamento aeróbico, como esperado. Ainda mais importante, sua matéria branca parecia renovada. Nos novos exames, as fibras nervosas em certas partes do cérebro deles pareciam maiores e qualquer lesão de tecido havia encolhido. Essas alterações desejáveis foram mais prevalentes entre os que caminharam, que também tiveram melhor desempenho nos testes de memória dessa vez. Isso não aconteceu com os dançarinos, de modo geral.
Enquanto isso, aqueles do grupo de controle, que não haviam praticado exercícios aeróbicos, mostraram declínio na saúde da substância branca após os seis meses, com maior afinamento e desgaste de seus axônios e queda nos resultados cognitivos.
Para aqueles que praticam exercícios, essas descobertas “são muito promissoras”, diz Agnieszka. Elas nos dizem que a substância branca permanece plástica e ativa, seja qual for a nossa idade; e algumas caminhadas rápidas por semana podem ser suficientes, disse ela, para polir o tecido e diminuir ou prevenir o declínio da memória.
Claro, as mudanças cerebrais foram sutis e um tanto inconsistentes. Agnieszka e seus colegas esperavam, por exemplo, que dançar produziria mais substância branca e melhorias cognitivas do que caminhar, afirmou, uma vez que dançar envolve mais aprendizado e prática. Mas caminhar foi mais potente, sugerindo que o exercício aeróbico, por si só, é mais importante para a saúde da substância branca. “Os dançarinos passavam parte de seu tempo em cada sessão observando os instrutores e sem se movimentar muito”, disse Agnieszka. “Isso provavelmente afetou seus resultados.”
Os participantes do estudo também tinham mais de 60 anos, eram sedentários e praticaram atividade física por apenas seis meses. Ainda não está claro se os cérebros de pessoas mais jovens e com melhor condicionamento também se beneficiariam ou se exercícios aeróbicos no longo prazo poderiam levar a melhorias maiores na memória e no pensamento. Mas, por ora, diz Agnieszka, os resultados oferecem “um forte argumento para nos levantarmos e nos movimentarmos” pelo bem de nossa substância branca. / TRADUÇÃO DE ROMINA CÁCIA
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