O uso de transgênicos ainda causa divergências, no entanto, cada vez
mais produtos utilizam organismos geneticamente modificados. O "Futurando"
conversou com especialistas sobre o tema.
Organismos geneticamente modificados (OGMs) foram tema de uma das
matérias da nona edição doFuturando. No programa, mostramos que plantas
do Himalaia têm a capacidade de sobreviver em condições extremas, como frio e
seca. Cientistas tentam agora reproduzir esta característica em outras plantas.
No Brasil, existem pesquisas semelhantes, mas transgênicos e biossegurança ainda
são temas polêmicos no país.
A modificação genética permite que plantas adquiram outras
características a partir de cruzamentos com outras espécies. O resultado são
exemplares mais fortes, resistentes a secas e a insetos, por exemplo. A
preocupação gira em torno dos aspectos relacionados à segurança alimentar e
ambiental.
No Brasil, é permitido plantar milho, soja, algodão e feijão
transgênicos. Todas essas plantas passaram pela avaliação da Comissão Técnica
Nacional de Biossegurança (CTNBio). Esta comissão presta apoio técnico na
atualização e implementação da Política Nacional de Biossegurança e no
estabelecimento de normas de segurança para a proteção humana e as atividades
que envolvam produtos transgênicos e derivados.
Um dos requisitos estudados é o risco de cruzar com espécies
nativas. Por enquanto, apenas estes OMGs foram liberadas para o uso comercial.
Mas já existe a perspectiva de que outras plantas, como cana-de-açúcar, sejam
liberadas.
Para informar o consumidor se ele está consumindo um alimento
geneticamente modificado, os rótulos possuem um selo de identificação. O
símbolo, um T preto sobre um triângulo amarelo, precisa estar nos rótulos de
produtos que contenham mais de 1% de matéria-prima transgênica. Até alimentos
como mingau para bebês já são produzidos com organismos geneticamente
modificados.
Para Cassio Franco Moreira, coordenador do Programa Agricultura e
Meio Ambiente do WWF-Brasil, é preciso ter prudência com este tema. "As
pesquisas sobre o assunto ainda não são conclusivas e a ciência ainda não mostra
exatamente quais os problemas trazidos pelo consumo dos transgênicos. A nossa
posição é cautelosa, precisamos aguardar posicionamentos mais claros da ciência
no que se refere aos riscos no uso destes produtos", diz Moreira.
As
discussões
Recentemente, a revista Food and Chemical Toxicology publicou um estudo que mostra que ratos
alimentados por milho transgênico morrem mais cedo e sofrem de câncer com mais
frequência do que os demais. O estudo utilizou 200 ratos e acompanhou o
desenvolvimento deles por dois anos. No entanto, a Autoridade Europeia para a
Segurança dos Alimentos (EFSA, na sigla em inglês) desqualificou o estudo,
afirmando que a metodologia foi falha.
"O grande problema é que para o consumidor final destes alimentos
as pesquisas ainda são inconclusivas. E por isso mesmo deveríamos ter cautela
por não ter certeza dos problemas trazidos à saúde e ao meio ambiente",
esclarece.
De acordo com Moreira, no caso do milho modificado, resistente à
lagarta-do-cartucho (Spodoptora frugiperda), foi verificado que, do primeiro ao
terceiro ano de cultivo, o uso de agrotóxicos é reduzido, o que pode ser
benéfico. No entanto, algumas pesquisas mostraram que com o tempo há um ganho de
resistência e depois dos três anos os produtores precisam usar os transgênicos
junto com o inseticida, já que a praga se adapta às novas condições. "Nossa
preocupação é usar a semente modificada com a mesma quantidade de inseticida
usado normalmente. Aí perde-se a vantagem do uso do transgênico", explica.
As
conquistas
Marie-Anne van Sluys, professora titular do Departamento de
Botânica do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo, tem uma visão
completamente diferente sobre o tema. Para a pesquisadora, é preciso
principalmente uma certificação do uso. "É preciso uma análise sobre a
qualidade, a equivalência e a liberação no meio ambiente que seja adequada, mas
isso é igual para qualquer alimento. Não há uma diferença associada ao fato da
transgenia, até porque muitas plantas domesticadas também são resultado de
cruzamentos que não aconteceriam normalmente e são gerados organismos que só
existem porque nós acompanhamos", diz.
"Atualmente, quando produzimos uma planta por melhoramento
clássico, ela é resistente até que o patógeno se adapte e desenvolva outra
estratégia de atacar a planta e aí o agricultor irá tentar produzir uma nova
linhagem que seja mais resistente. Esse é um processo que existe em todo e
qualquer ser biológico", explica a professora.
A pesquisadora liderou um dos grupos de pesquisa que fez o
sequenciamento dos genes da bactéria Xylella, causadora da doença Clorose
Variegada (popularmente conhecida como amarelinho) que ataca plantações de
laranja. Os frutos contaminados pela bactéria endurecem e não podem ser usados
para a indústria de sucos. Com o mapeamento, foi possível buscar soluções para
prevenir e combater a Xylella.
Outro produto destacado pela pesquisadora é o feijão. "A produção
de feijão no Brasil, que é resistente à mosca branca, foi uma conquista
importante. Essa é uma doença local que tem um impacto sobre um produto, que é a
base da alimentação brasileira." Segundo ela, garantir a produção do feijão que
vai chegar à mesa do consumidor com um valor senão igual, mas talvez até um
pouco mais barato devido à menor demanda de insumos para a produção, "pode ser
considerado uma conquista fantástica".
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