Entrevista
- Publicada em 19h00min, 24/05/2021Gilberto Porcello Petry, presidente da Fiergs, alerta que elevação nos insumos é preocupante
LUIZA PRADO/JC
Cristiano Vieira, editor de Economia
Jornal do Comércio - Quais os caminhos para a retomada
econômica do Brasil e do RS neste ano? Estão mantidas para este ano as
estimativas feitas em dezembro de 2020 – alta de 4% para o PIB gaúcho e
de 3,2% para o do Brasil?
Gilberto Petry - Sim, por enquanto mantemos a
nossa expectativa. Já estávamos esperando um primeiro trimestre com
setor de comércio e serviços, que representam mais de 60% do PIB, ainda
sentindo os impactos da pandemia. Também já projetávamos uma recuperação
mais intensa no segundo semestre com o avanço da vacinação. Para o Rio
Grande do Sul também já tínhamos a expectativa de uma forte recuperação
na produção agrícola, por isso um crescimento mais intenso para o
Estado. A depender da publicação dos resultados da safra e do PIB do
primeiro trimestre no início de junho, podemos ajustar para cima a
previsão de crescimento do Rio Grande do Sul e do Brasil nesse ano,
lembrando que no ano passado a queda no PIB gaúcho foi de 7,0%, mais
intensa do que a nacional (-4,1%).
JC - O que a indústria precisa para crescer neste ano?
Petry - Ainda estamos muito preocupados com o
atual nível dos custos, principalmente de matérias-primas. Se não houver
um recuo, a tendência é de preços mais altos e produção menor. Um
mercado consumidor mais pobre inviabiliza que as indústrias produzam em
escala, o que é fundamental para a redução do custo médio de produção. A
indústria vive em constante processo de adaptação para se manter
competitiva. As empresas precisam de estratégias em diversas áreas e não
apenas nos processos de produção. Hoje em dia, um pequeno diferencial
em questões como logística, concorrência, comunicação, qualificação e
relações governamentais – para citar apenas algumas – pode ser a
diferença para manter ou agregar um novo cliente. Ressalto isso para
dizer que a pandemia afetou todos esses segmentos. O frete marítimo, por
exemplo, ficou dez vezes mais caro em algumas rotas, isso significa uma
necessidade de repensar fornecedores. Outra questão está nas compras
on-line, que também exigem agilidade para entrega e devolução, o que
aproxima as fábricas dos clientes finais. Destaco também as questões
ligadas à Governança Ambiental, Social e Corporativa, o chamado ESG, que
ganhou muita popularidade no último ano. Esses são apenas alguns
fatores que sofreram forte impacto recentemente.
JC - Pouco mais de um ano após o início da pandemia, o pior já passou para o setor industrial?
Petry - Podemos afirmar que sim. A parada abrupta
da demanda e da produção em março e abril de 2020 foi sem precedentes,
um período de incertezas como não se via há muito tempo, e que
dificilmente irá se repetir tão cedo. Atualmente, o setor já vivencia um
processo mais disseminado de recuperação, numa clara indicação de que o
pior já passou. Porém, isso não significa que não existam desafios pela
frente. Reitero que o alto custo das matérias-primas e a sustentação da
demanda são temas que preocupam os industriais em 2021.
JC - Alguns setores reclamam de alta nos preços do aço e de
falta de insumos como papelão, vidro e embalagens, o que vem ocorrendo
desde o ano passado. Há perspectiva de melhora nesta questão nos
próximos meses?
Petry - Realizamos pesquisas com os empresários
industriais para entender essa normalização e a maioria, 50,3%, espera
que será depois do primeiro semestre, sendo que destes, 40,1% esperam
que seja durante o segundo semestre e 10,2% somente em 2022. Esse
problema nas cadeias de suprimentos está afetando o mundo todo, e tem
levado a paralisação e atrasos nas atividades, sem contar no aumento dos
custos. O Rio Grande do Sul ainda tem sorte de ter um polo petroquímico
e indústrias metalúrgicas próximas, o que agiliza no processo de
logística e abastecimento.
JC - Recentemente, o Copom elevou a Selic para 3,5%, na
tentativa de segurar a alta inflacionária. Depois de meses em queda, os
juros do Brasil voltaram a subir. É um remédio amargo, mas necessário?
Petry - Sabemos que a inflação elevada e a
desordem macroeconômica levam a diversos problemas, geralmente maiores
do que os juros um pouco mais elevados. É um remédio amargo, mas
necessário no momento. A dívida pública atingiu patamares impensáveis
por conta dos gastos da pandemia, e por outro lado, o governo estava
conseguindo se financiar com taxas de juros reais negativas. Diante
desse cenário, já era possível prever que a taxa Selic em 2% era algo
temporário. Por outro lado, historicamente sempre alertamos que o
elevado custo de capital é uma das amarras para o crescimento da
economia brasileira, principalmente da indústria. Também destacamos as
causas disso, uma delas é o elevado patamar da dívida pública e o
crescimento dos gastos obrigatórios. Por isso, sempre alertamos os
governos da necessidade de manter a responsabilidade fiscal.
JC - O setor industrial já está operando a pleno, a níveis anteriores à pandemia, no Rio Grande do Sul?
Petry - Quando tomamos os números agregados,
podemos falar que sim. Os dados da produção industrial do IBGE mostram
que o setor retornou ao patamar pré-pandemia em setembro de 2020. Nesse
período, o setor trabalhou com uma Utilização da Capacidade Instalada
acima da média histórica. Porém, cada segmento da indústria possui a sua
realidade. Por exemplo, a produção de máquinas agrícolas sentiu menos
os efeitos da pandemia do que o segmento de veículos de passeio. A
normalização ainda pode demorar mais tempo dependendo de qual segmento
estamos tratando.
JC - O câmbio oscilou no último ano e entrou 2021 em
elevação. Agora está se estabilizando, parece, ao redor de 5,20 – o que é
bom para os exportadores mas ruim para os importadores. Para as
indústrias o câmbio tem afetado a compra de componentes?
Petry - O impacto da desvalorização cambial sobre a
indústria depende muito do lapso temporal que analisamos. Num primeiro
momento, a desvalorização tende a ser negativa, pois os preços dos
insumos são reajustados mais rapidamente do que o preço dos produtos
industrializados exportados. Assim, o efeito inicial pode ser sentido
como de aumento de custos de produção, pois existem contratos de vendas
com preços fixados. Na medida em que os meses passam, as indústrias
conseguem obter novos pedidos com uma realidade cambial mais favorável e
isso tende a favorecer a rentabilidade das empresas exportadoras.
Porém, a estabilidade cambial, ou seja, a menor volatilidade, tende a
ser o melhor para a indústria ao longo do tempo. Essas variações tornam
muito difícil manter uma estratégia comercial e de preços para o setor.
JC - Quais as demandas mais urgentes do segmento industrial
e da FIERGS para tornar o RS mais competitivo frente aos outros estados
brasileiros? Redução de imposto, ampliação pista do Salgado Filho,
reduzir custos com logística?
Petry - Redução de impostos é sempre uma medida
desejável, porém nós sabemos que o nível dos impostos é uma função dos
gastos públicos, por isso sempre batemos na tecla da responsabilidade
fiscal e da adequação do tamanho do Estado. Só com o controle dos gastos
teremos menos impostos. Os investimentos em infraestrutura também são
urgentes. A ampliação da pista do Salgado Filho é algo que está
limitando o potencial do Estado e diminuindo a rentabilidade de muitas
empresas. Porém, para a indústria gaúcha como um todo, a principal
medida diz respeito à aprovação da Reforma Tributária, com a criação de
um Imposto sobre o Valor Agregado (IVA) em substituição ao ICMS, nos
moldes do proposto pela PEC 45. O IVA faz com que o imposto deixe de ser
cobrado na origem e passe a ser cobrado no destino. Isso eliminaria a
guerra fiscal, por exemplo. Muitas empresas que optaram por se instalar
em outras unidades da federação ou empresas gaúchas que expandiram para
fora o fizeram por conta de uma vantagem tributária, não porque o Rio
Grande do Sul não dava condições para a produção aqui. Porém, quando se
colocava na ponta do lápis quanto se pagaria de impostos, principalmente
ICMS, no RS vis-à-vis em outros estados, a decisão era de não investir
aqui. Com uma reforma tributária em que os impostos são recolhidos
conforme as alíquotas do destino, o Rio Grande do Sul pode voltar a ser
muito competitivo na atração de indústrias.
JC - A vacinação começou em janeiro e continua por todo o
Brasil, ainda sem uma previsão certa de quando atingiremos toda a
população, pois dependemos da disponibilidade de vacinas. Para a
entidade, a vacinação é essencial para garantir uma volta à normalidade
econômica?
Petry - Quanto mais ágil for, melhor para ajudar
na retomada definitiva. A vacinação é importante porque protege a
população e permite ao País voltar ao ritmo normal o mais breve
possível.
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