quarta-feira, 26 de maio de 2021

Reduzir custos dos insumos é essencial, projeta Fiergs

Entrevista

- Publicada em 19h00min, 24/05/2021

Gilberto Porcello Petry, presidente da Fiergs, alerta que elevação nos insumos é preocupante

Gilberto Porcello Petry, presidente da Fiergs, alerta que elevação nos insumos é preocupante


LUIZA PRADO/JC
Cristiano Vieira, editor de Economia
Jornal do Comércio - Quais os caminhos para a retomada econômica do Brasil e do RS neste ano? Estão mantidas para este ano as estimativas feitas em dezembro de 2020 – alta de 4% para o PIB gaúcho e de 3,2% para o do Brasil?
Gilberto Petry - Sim, por enquanto mantemos a nossa expectativa. Já estávamos esperando um primeiro trimestre com setor de comércio e serviços, que representam mais de 60% do PIB, ainda sentindo os impactos da pandemia. Também já projetávamos uma recuperação mais intensa no segundo semestre com o avanço da vacinação. Para o Rio Grande do Sul também já tínhamos a expectativa de uma forte recuperação na produção agrícola, por isso um crescimento mais intenso para o Estado. A depender da publicação dos resultados da safra e do PIB do primeiro trimestre no início de junho, podemos ajustar para cima a previsão de crescimento do Rio Grande do Sul e do Brasil nesse ano, lembrando que no ano passado a queda no PIB gaúcho foi de 7,0%, mais intensa do que a nacional (-4,1%).
JC - O que a indústria precisa para crescer neste ano?
Petry - Ainda estamos muito preocupados com o atual nível dos custos, principalmente de matérias-primas. Se não houver um recuo, a tendência é de preços mais altos e produção menor. Um mercado consumidor mais pobre inviabiliza que as indústrias produzam em escala, o que é fundamental para a redução do custo médio de produção. A indústria vive em constante processo de adaptação para se manter competitiva. As empresas precisam de estratégias em diversas áreas e não apenas nos processos de produção. Hoje em dia, um pequeno diferencial em questões como logística, concorrência, comunicação, qualificação e relações governamentais – para citar apenas algumas – pode ser a diferença para manter ou agregar um novo cliente. Ressalto isso para dizer que a pandemia afetou todos esses segmentos. O frete marítimo, por exemplo, ficou dez vezes mais caro em algumas rotas, isso significa uma necessidade de repensar fornecedores. Outra questão está nas compras on-line, que também exigem agilidade para entrega e devolução, o que aproxima as fábricas dos clientes finais. Destaco também as questões ligadas à Governança Ambiental, Social e Corporativa, o chamado ESG, que ganhou muita popularidade no último ano. Esses são apenas alguns fatores que sofreram forte impacto recentemente.
JC - Pouco mais de um ano após o início da pandemia, o pior já passou para o setor industrial?
Petry - Podemos afirmar que sim. A parada abrupta da demanda e da produção em março e abril de 2020 foi sem precedentes, um período de incertezas como não se via há muito tempo, e que dificilmente irá se repetir tão cedo. Atualmente, o setor já vivencia um processo mais disseminado de recuperação, numa clara indicação de que o pior já passou. Porém, isso não significa que não existam desafios pela frente. Reitero que o alto custo das matérias-primas e a sustentação da demanda são temas que preocupam os industriais em 2021.
JC - Alguns setores reclamam de alta nos preços do aço e de falta de insumos como papelão, vidro e embalagens, o que vem ocorrendo desde o ano passado. Há perspectiva de melhora nesta questão nos próximos meses?
Petry - Realizamos pesquisas com os empresários industriais para entender essa normalização e a maioria, 50,3%, espera que será depois do primeiro semestre, sendo que destes, 40,1% esperam que seja durante o segundo semestre e 10,2% somente em 2022. Esse problema nas cadeias de suprimentos está afetando o mundo todo, e tem levado a paralisação e atrasos nas atividades, sem contar no aumento dos custos. O Rio Grande do Sul ainda tem sorte de ter um polo petroquímico e indústrias metalúrgicas próximas, o que agiliza no processo de logística e abastecimento.
JC - Recentemente, o Copom elevou a Selic para 3,5%, na tentativa de segurar a alta inflacionária. Depois de meses em queda, os juros do Brasil voltaram a subir. É um remédio amargo, mas necessário?
Petry - Sabemos que a inflação elevada e a desordem macroeconômica levam a diversos problemas, geralmente maiores do que os juros um pouco mais elevados. É um remédio amargo, mas necessário no momento. A dívida pública atingiu patamares impensáveis por conta dos gastos da pandemia, e por outro lado, o governo estava conseguindo se financiar com taxas de juros reais negativas. Diante desse cenário, já era possível prever que a taxa Selic em 2% era algo temporário. Por outro lado, historicamente sempre alertamos que o elevado custo de capital é uma das amarras para o crescimento da economia brasileira, principalmente da indústria. Também destacamos as causas disso, uma delas é o elevado patamar da dívida pública e o crescimento dos gastos obrigatórios. Por isso, sempre alertamos os governos da necessidade de manter a responsabilidade fiscal.
JC - O setor industrial já está operando a pleno, a níveis anteriores à pandemia, no Rio Grande do Sul?
Petry - Quando tomamos os números agregados, podemos falar que sim. Os dados da produção industrial do IBGE mostram que o setor retornou ao patamar pré-pandemia em setembro de 2020. Nesse período, o setor trabalhou com uma Utilização da Capacidade Instalada acima da média histórica. Porém, cada segmento da indústria possui a sua realidade. Por exemplo, a produção de máquinas agrícolas sentiu menos os efeitos da pandemia do que o segmento de veículos de passeio. A normalização ainda pode demorar mais tempo dependendo de qual segmento estamos tratando.
JC - O câmbio oscilou no último ano e entrou 2021 em elevação. Agora está se estabilizando, parece, ao redor de 5,20 – o que é bom para os exportadores mas ruim para os importadores. Para as indústrias o câmbio tem afetado a compra de componentes?
Petry - O impacto da desvalorização cambial sobre a indústria depende muito do lapso temporal que analisamos. Num primeiro momento, a desvalorização tende a ser negativa, pois os preços dos insumos são reajustados mais rapidamente do que o preço dos produtos industrializados exportados. Assim, o efeito inicial pode ser sentido como de aumento de custos de produção, pois existem contratos de vendas com preços fixados. Na medida em que os meses passam, as indústrias conseguem obter novos pedidos com uma realidade cambial mais favorável e isso tende a favorecer a rentabilidade das empresas exportadoras. Porém, a estabilidade cambial, ou seja, a menor volatilidade, tende a ser o melhor para a indústria ao longo do tempo. Essas variações tornam muito difícil manter uma estratégia comercial e de preços para o setor.
JC - Quais as demandas mais urgentes do segmento industrial e da FIERGS para tornar o RS mais competitivo frente aos outros estados brasileiros? Redução de imposto, ampliação pista do Salgado Filho, reduzir custos com logística?
Petry - Redução de impostos é sempre uma medida desejável, porém nós sabemos que o nível dos impostos é uma função dos gastos públicos, por isso sempre batemos na tecla da responsabilidade fiscal e da adequação do tamanho do Estado. Só com o controle dos gastos teremos menos impostos. Os investimentos em infraestrutura também são urgentes. A ampliação da pista do Salgado Filho é algo que está limitando o potencial do Estado e diminuindo a rentabilidade de muitas empresas. Porém, para a indústria gaúcha como um todo, a principal medida diz respeito à aprovação da Reforma Tributária, com a criação de um Imposto sobre o Valor Agregado (IVA) em substituição ao ICMS, nos moldes do proposto pela PEC 45. O IVA faz com que o imposto deixe de ser cobrado na origem e passe a ser cobrado no destino. Isso eliminaria a guerra fiscal, por exemplo. Muitas empresas que optaram por se instalar em outras unidades da federação ou empresas gaúchas que expandiram para fora o fizeram por conta de uma vantagem tributária, não porque o Rio Grande do Sul não dava condições para a produção aqui. Porém, quando se colocava na ponta do lápis quanto se pagaria de impostos, principalmente ICMS, no RS vis-à-vis em outros estados, a decisão era de não investir aqui. Com uma reforma tributária em que os impostos são recolhidos conforme as alíquotas do destino, o Rio Grande do Sul pode voltar a ser muito competitivo na atração de indústrias.
JC - A vacinação começou em janeiro e continua por todo o Brasil, ainda sem uma previsão certa de quando atingiremos toda a população, pois dependemos da disponibilidade de vacinas. Para a entidade, a vacinação é essencial para garantir uma volta à normalidade econômica?
Petry - Quanto mais ágil for, melhor para ajudar na retomada definitiva. A vacinação é importante porque protege a população e permite ao País voltar ao ritmo normal o mais breve possível.

 

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