Alexandre
Schwartsman. Opinião Econômica. O custo da ignorância.
Se há alguma inovação
vinda do "pensamento" econômico do PT, a probabilidade de que seja
uma péssima ideia tende a 100%. É o caso do projeto de tributar as operações de
crédito em que o spread bancário é mais alto. Os idealizadores da proposta
acreditam que isso desestimularia a prática. O resultado, porém, deverá ser
exatamente o oposto. Peço, contudo, um pouco de paciência, porque a compreensão
desse problema requer um tanto de matemática, disciplina que, como se sabe,
causa urticárias aos "economistas" do partido. Para entender a
questão, considere um banco que capte R$ 100,00 pagando a taxa Selic, isto é,
6,5% ao ano. Suponha também que, no fim da operação de crédito, o banco espere
receber um spread de 1,5%, ou seja, 8,00% ao ano. Por fim, vamos imaginar que o
banco tenha que deixar 20% do volume captado depositado no Banco Central (BC) -
para manter as contas simples, na medida do possível, presume-se que o BC nada
paga sobre esse depósito. Caso não haja nenhum risco de calote, o banco terá
que cobrar 10% ao ano de seu cliente. Como os 10% incidem sobre R$ 80,00, o
rendimento do empréstimo é de R$ 8,00 para cada R$ 100,00 captados, ou seja,
8%. O spread observado nesse caso é 3,5% (10%-6,5%), embora o spread recebido
de fato pelo banco seja 1,5% (recebe R$ 8,00 e paga R$ 6,50 de juros). O que
ocorreria se o banco fosse emprestar para tomadores cuja chance de calote seja,
digamos, 20%? De cada R$ 100 captados, R$ 80,00 seriam emprestados, mas apenas
R$ 64,00 retornariam ao banco. Nesse caso, a taxa cobrada teria que ser 12,5%
ao ano, pois o rendimento de 12,5% sobre R$ 64,00 geraria R$ 8,00, mantendo o
retorno do banco em 8%, como almejado. No caso, o risco de calote faria o spread
observado saltar para 6% (12,5%-6,5%), embora o spread final permaneça em 1,5%
(8%-6,5%). Digamos que, no primeiro caso, em que o spread observado era 3,5%,
não coubesse imposto, mas que, no segundo caso, em que o spread observado é
mais alto (6%, como vimos), incidisse um imposto de 10%. Assim, se o banco
cobrasse os mesmos 12,5%, receberia R$ 8,00 sobre os R$ 64,00, mas pagaria R$
0,80 de impostos, ou seja, no fim do processo, receberia R$ 7,20 para cada R$
100,00 captados, retorno de 7,2%. Para manter o retorno de R$ 8,00 para cada R$
100,00 captados, teria que cobrar cerca de 13,9% ao ano, que geraria R$ 8,88
antes de impostos (e, claro, R$ 8,00 para cada R$ 100,00 captados depois do
imposto). Em outras palavras, a proposta de tributar os spreads observados mais
altos faria com que o custo para o tomador final subisse de 12,5% para 13,9% ao
ano, isto é, o spread se elevaria de 6% para 7,4%, precisamente o oposto do
objetivo da proposta. Há, obviamente, que considerar a reação dos tomadores. É
possível que alguns não possam arcar com o empréstimo caso o custo chegue a
quase 14% ao ano. Outros, provavelmente mais necessitados, seguiriam com seus
planos, mesmo com juros mais altos. Nessa linha, quanto menor for a
sensibilidade do tomador de empréstimos à taxa de juros (ou seja, quanto maior
for sua necessidade de recursos), tanto maior será o repasse do imposto ao
custo do crédito. Em bom português, trata-se de uma ideia cretina: vende a
ilusão de que o imposto mais alto punirá os bancos, mas que acabará encarecendo
o custo dos empréstimos precisamente para quem mais necessita deles.
Consultor,
ex-diretor do Banco Central (2003-2006) - Jornal do Comércio
(https://www.jornaldocomercio.com/_conteudo/colunas/opiniao_economica/2018/08/645010-o-custo-da-ignorancia.html)
Nenhum comentário:
Postar um comentário