quarta-feira, 5 de setembro de 2018

A comunicação com os filhos


 
Por Carla Poppa*, Doutora em psicologia clínica pela PUC-SP, 

Como os pais podem ampliar sua capacidade de comunicação com seus filhos?

O principal beneficio, quando existe uma boa comunicação entre pais e filhos, é que a relação deixa de ser baseada no controle e passa a ser sustentada pela confiança! Isso significa que conforme a criança cresce e se torna quase impossível controlar seus comportamentos e relações, os pais ainda terão como influenciar as experiências e escolhas dos seus filhos por meio da confiança e da comunicação que foi desenvolvida entre eles ao longo do tempo. Para isso, é importante investir na qualidade da comunicação com seu filho desde cedo e estas são algumas dicas de como fazer isso no dia a dia!

Ajude seu filho a nomear o que sente.
O primeiro cuidado para ter uma boa comunicação com seu filho é ajuda-lo a desenvolver a sua capacidade de comunicação e esse cuidado começa desde os seus primeiros anos de vida! As melhores oportunidades para ajudar a criança a desenvolver sua capacidade de comunicação são os momentos nos quais ela esta agitada, irritada, chorosa, mostrando um incomodo por estar em contato com uma emoção.  Nesses momentos, tente se colocar no lugar da criança para ajuda-la a nomear o que ela esta sentindo. Para isso, experimente pensar no que aconteceu durante o dia ou quais mudanças ela vem enfrentando nos últimos tempos. Se você perceber o que sentiria se estivesse passando pela mesma situação, diga isso para ela. Por exemplo, se você notou que o avô que a criança gosta bastante está doente e deixou de visitá-la e que há algum tempo ela parece mais chorosa e sensível; experimente contar para a criança que se você estivesse no lugar dela provavelmente estaria com saudades e preocupada com o avô. Ao fazer isso, você esta ajudando a criança a encontrar as palavras que expressam suas emoções. Com o tempo, conforme estas experiências se repetem, a criança aprende a dar nome para suas emoções por conta própria. Então, ao invés de ficar agitada, ou chorosa, por exemplo, ela consegue procurar os pais e dizer que esta se sentindo triste, o que facilita muito a comunicação!

Se você não souber o que aconteceu, faca perguntas concretas e detalhadas.
Pode ser que a agitação ou irritação da criança não tenha sido provocada por um acontecimento que você presenciou; pode ter sido provocado por um desentendimento com o melhor amigo na escola, por exemplo. Nesses casos, para que você consiga ajudar a criança a nomear o que sente, você vai precisar primeiro ajuda-la a contar o que aconteceu. Para isso, experimente fazer perguntas concretas e detalhadas, faça referência ao recreio, pergunte do que a criança brincou e com quem, citando o nome dos amigos dela, por exemplo. Se ela contar que passou o recreio com um novo amigo e quando você perguntar do amigo mais próximo, ela mudar de assunto, por exemplo, pergunte, o que aconteceu entre ela e o melhor amigo. Se for algum desentendimento entre eles que a deixou triste, é possível que nesse momento ela comece a falar do melhor amigo e dos últimos acontecimentos espontaneamente e fisicamente você vai perceber que ela fica mais interessada na conversa, é bem provável que ela olha para você com atenção e se concentre na conversa. Conforme a criança conta o que aconteceu, experimente escutar sem a intenção de julgar se ela agiu de maneira certa ou errada, tente escutar se colocando no lugar dela com a intenção de se conectar com as emoções que ela sentiu nessas interações.

Evite reações automáticas e tente responder de maneira empática
Nessas mesmas situações, quando a criança estiver agitada, chorosa ou irritada; ao invés de reagir de maneira automática diante da irritação que esses comportamentos te provocam e criticá-la, ou pensar em uma punição, por exemplo; tente respirar fundo por uns instantes para pensar em uma resposta empática. Ou seja, em um gesto que esteja em sintonia com o que a criança esta sentindo. Se você observar que a criança brigou com um amigo e perceber que ela esta com raiva, por exemplo, ao invés de reagir de maneira automática à irritação que a raiva da criança provoca em você e gritar ou coloca-la de castigo ate que ela fique quieta; experimente tirar a criança da situação, dar uma volta com ela ate que ela se acalme e ofereça algumas sugestões de como ela poderia ter agido no conflito com o amigo. Diga que ela poderia ter se afastado ou dito para o amigo de maneira firme que não gostou do que ele fez por exemplo.
Com o tempo, então, a criança consegue não só contar para os pais o que esta sentindo, como também o que aconteceu e como ela reagiu. E essas são as habilidades necessárias para que a criança seja capaz de comunicar suas experiências!!

Tente relembrar da sua infância
Ter alguns momentos de reflexão, nos quais você tenta se lembrar de momentos marcantes da sua infância, para identificar como você se sentiu e qual cuidado gostaria de ter recebido nessas situações pode ser um exercício que facilita a capacidade de responder de maneira empática aos sentimentos do seu filho.

 Reserve um momento para refletir sobre as suas próprias experiências
Pode ser com o terapeuta, com amigos ou até mesmo desenvolver o hábito de escrever os acontecimentos e seus sentimentos. A meditação também pode te ajudar a ter consciência do que acontece ao seu redor, de como esses acontecimentos fazem você se sentir e como você reage a esses acontecimentos. Este exercício é fundamental para que você consiga comunicar o que acontece com você e como você se sente com propriedade e a partir dai ser capaz de ajudar seu filho a fazer o mesmo!

Preste atenção no que seu filho diz e compartilhe suas próprias experiências
Conforma a criança desenvolve sua capacidade de se comunicar, a atenção passa a ser um cuidado fundamental. A falta de atenção, seja por excesso de preocupações, por ansiedade, pelo uso excessivo de celular e aparelhos eletrônicos e até mesmo pela depressão, interrompe o diálogo, pois a criança percebe na fisionomia dos seus pais que as experiências que ela esta contando não os mobilizam. Por outro lado, a escuta atenta mantém o canal da comunicação aberto.
Quando os pais escutam a experiência que seus filhos relatam, eles podem compartilhar suas próprias experiências; situações nas quais se lembraram de terem se sentindo de maneira semelhante. Essa troca é importante para que a criança perceba que não é a única a se sentir dessa maneira, o que ameniza a intensidade de algumas emoções e, além disso, pode ampliar o repertório da criança para lidar com diferentes situações. Se a criança conta que esta com medo de mudar de escola, por exemplo, e o pai se lembra da ultima vez que mudou de trabalho e da insegurança que ele sentiu, ele pode compartilhar essa lembrança com o seu filho e contar como ele agiu no primeiro dia no novo emprego.
Além de amenizar a insegurança da criança e de ampliar seu repertório para lidar com diferentes situações, a troca de experiências que acontece no diálogo fortalece a confiança na relação com o filho(a), pois a criança percebe o bem estar que essas conversas proporcionam e reconhecem que seus pais são um ponto de apoio importante para ajudá-la nos desafios do dia a dia. Com isso, conforme ela cresce e não é mais possível controlar suas atitudes para garantir sua segurança e bem estar, existe ainda esse canal do dialogo que foi construído ao longo do tempo e que pode sempre ser usado tanto quando os pais sentirem necessidade de orientar seu filho(a), como também quando o filho(a) sentir necessidade do apoio dos pais.

*Carla Poppa é Doutora em psicologia clínica pela PUC-SP, é professora do curso de especialização em Gestalt-terapia e de cursos de psicoterapia de crianças no Instituto Sedes Sapientiae. Também realiza supervisões e grupos de estudos. É psicoterapeuta de crianças, adolescentes e adultos. Autora do livro “O suporte para o contato – Gestalt e infância.”

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