quinta-feira, 17 de fevereiro de 2022

Tributação de combustíveis: Soluções mal desenhadas podem ter custos sociais, ambientais e econômicos muito elevados

Mudanças na tributação de combustíveis dependem de uma reforma mais ampla sobre bens e serviços

Bernard Appy*, O Estado de S.Paulo

15 de fevereiro de 2022 

A tributação dos combustíveis virou tema central no debate político nacional. Soluções mal desenhadas podem ter, no entanto, custos sociais, ambientais e econômicos muito elevados. Alguns pontos, enumerados a seguir, podem ajudar na discussão.

1) Num momento em que o mundo discute a transição para uma economia menos intensiva em carbono, não faz qualquer sentido desonerar combustíveis fósseis. Ao contrário, para estimular a ampliação do uso de carros elétricos (processo em que o Brasil está bastante atrasado), o ideal é que a carga incidente sobre os combustíveis fósseis seja mais elevada que sobre os demais produtos.

Gasolina
Migração para outro modelo de tributação pressupõe uma transição bastante longa, para não haver um impacto traumático sobre as finanças estaduais e municipais Foto: Werther Santana/ Estadão

2) Para estabilizar a volatilidade dos preços dos combustíveis, seria preciso elevar a tributação em períodos em que os preços estão baixos para reduzi-la quando os preços sobem. O Brasil tem um instrumento para fazer este ajuste, que é a Cide-Combustíveis, mas optou por não utilizá-lo quando os preços estavam baixos.

3) A responsabilidade por uma política de redução da volatilidade dos preços dos combustíveis deveria ser da União, e não dos Estados, cuja tributação apenas acompanha a variação dos preços. Não faz qualquer sentido mudar a forma de cobrança de ICMS sobre combustíveis por motivos conjunturais, até porque o efeito sobre as finanças dos Estados e municípios tende a ser muito grande. Ninguém reclamou do modelo de cobrança do ICMS quando o preço dos combustíveis estava baixo.

4) Mesmo no caso do governo federal, a desoneração tributária ou a concessão de subsídios para reduzir o preço de combustíveis precisa ser bem ponderada, pois seu custo é muito alto. Recursos públicos são escassos e, certamente, há carências sociais mais urgentes e relevantes que a redução do preço da gasolina.

Isso posto, entendo que faz sentido mudar, estruturalmente, o modelo de cobrança do ICMS sobre combustíveis, adotando valores fixos por litro nacionalmente uniformes. A migração para esse modelo pressupõe uma transição bastante longa, para não haver um impacto traumático sobre as finanças estaduais e municipais. A mudança também deveria contemplar a recuperação do imposto, na forma de crédito, quando o combustível é usado como insumo – resolvendo de forma definitiva o debate sobre o impacto da tributação dos combustíveis para os caminhoneiros.

Para fazer essas mudanças, no entanto, é necessária uma reforma ampla da tributação dos bens e serviços, na linha das propostas atualmente em discussão no Congresso Nacional.

*DIRETOR DO CENTRO DE CIDADANIA FISCAL

 

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