A psicóloga Natércia Tiba fala dos animais de estimação, que deixam a vida das crianças mais ativa e feliz
Roberta Manreza*
Neste podcast do Papo de Mãe, da OLA Podcasts, você ouve a entrevista completa de Roberta Manreza com a psicóloga Natércia Tiba.
Antes de apontar os diversos benefícios da relação entre as crianças e os animais de estimação, Natércia, apaixonada por bichos, faz um alerta: “Essa convivência precisa ser responsável”. Segundo ela, pais, mães e os pequenos devem cuidar muito bem dos pets, que também merecem nosso carinho, atenção e amor. A psicóloga, uma das criadoras do Projeto Amor de Pet, que resgata animais das ruas até eles serem adotados, conta que gosta de lembrar aos pais que quando eles falam em adotar ou ter um pet em casa, que é uma oportunidade maravilhosa de você ter uma melhora na qualidade de vida, que o seu filho vai aprender uma série de responsabilidades, vai ter empatia, se sentir amado de uma maneira que faz muito bem para a autoestima dele, mas que também acaba sendo a oportunidade de você ensinar descaso para ele, a irresponsabilidade, como se pode descartar uma relação. “Era filhotinho fofinho, agora cresceu e está dando trabalho, vamos dar para alguém?” descreve Natércia, mostrando que o relacionamento tem os dois lados.
Ensinamentos
Natércia diz que o Projeto Amor de Pet vem acompanhando esse processo, dos cachorros adotados durante a pandemia, mesmo os nossos cachorros que já estavam em casa, eles acostumaram com um nível de presença, com uma rotina que não é a nossa rotina real. Ela esclarece que são animaizinhos que a gente tem que ficar atento, que quando a vida for voltando ao normal, e isso já está acontecendo, a gente tem orientado adotantes, eles vão começar a apresentar sinais de ansiedade, de abandono, de se sentir sozinhos. “Mas até nisso, eu acho super interessante, a gente sentar, ao invés de só resolver a situação, poder, meu lado psicóloga, falar como é que a gente faz? Ele está acostumado a ficar com gente em casa, vamos pensar, o que a gente pode fazer para ele se sentir melhor, vamos inventar alguns brinquedinhos, que distraiam mais ele, vamos deixar seu pijama em um lugar onde ele consiga sentir seu cheiro, que você vai estar na escola, ele já não está mais acostumado que você esteja na escola. Você ensina tanta coisa, como eu tenho empatia, como eu me solidarizo com a sensação do cachorro ou do gatinho estar sozinho. Tudo isso tem um aprendizado maravilhoso para os filhos”, analisa a psicóloga.
Felicidade
Ter um bichinho em casa deixa as crianças mais felizes? Para Natércia, de modo geral, sim. Ela explica que temos que saber como é cada criança e que não é uma coisa que pode ser imposta. A psicóloga diz que, em geral, se a gente pensar em uma criança saudável, ela tem vontade de conviver com animal de estimação, a não ser que ela já tenha vivido uma situação de medo. Ela conta: “Então, poder ter um animal de estimação vai fazer com que ela tenha um olhar para o outro, uma sensação de companhia, aprender uma outra linguagem do afeto, menos racional, muito mais emocional, trazer o lúdico, até em aulas online, os professores super sérios, aí passa o gato de alguém, e aí dá aquela relaxada, então, tem esse humor e uma flexibilidade, deixar as coisas menos rígidas”. Natércia adianta que para a criança também será um aprendizado, que no começo pode não ser tão gostoso, mas que é um grande aprendizado. Ela explica que o que os pequenos deixarem bagunçado, largado, vai ser roído, vai ser comido, então acaba fazendo com que as crianças aprendam a cuidar mais das suas coisas. E também entender que se o cachorrinho roeu, não adianta ficar uma fera com ele, ele é um bichinho. “Como eu olho para o outro diante das possibilidades dele, das características dele, de não ser um ser racional como nós somos. Aceitar o outro”, analisa ela.
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Amizade
Ter um animal de estimação em casa e o desenvolvimento social da criança. Interagir com o pet facilita na hora dos pequenos fazerem amigos? Natércia diz que ajuda muito. Ela conta que se a gente pensar em casos de adultos, por exemplo, com fobia social, quando eles têm cachorro, eles começam a se soltar, porque você acaba conversando com o cachorro que está do seu lado, ele é uma companhia. E se você sai com o animal, as pessoas vem falar com você, ele vira assunto, a criança quer chamar os amiguinhos para virem ver, conhecer e brincar junto. Então, segundo ela, o bichinho acaba favorecendo bastante a sociabilidade e também essa flexibilidade da criança de que, talvez, ela queira brincar com o animalzinho de um jeito que ele não quer brincar e ela tem que aceitar. “Não ainda forçar a barra. Vira um aprendizado, a criança vai se tornando mais flexível na vida, ganhando jogo de cintura e isso é um ganho de qualidade de vida maravilhoso, porque as crianças que são muito rígidas, só do jeito que eu quero e que não aprende a se frustrar, os pais sofrem e os filhos sofrem”, relata Natércia.
Amor
Quais os benefícios dessa troca de afeto entre crianças e animais de estimação? A psicóloga esclarece que são desde benefícios emocionais não fáceis de se mapear, mas que existem aqueles que a gente sabe que aumentam a liberação de oxitocina, que é o hormônio do amor, hormônio do relacionamento, então você fica mais afetivo, mesmo, porque eles provocam essa sensação do afeto quimicamente na gente. Ela conta: “Tem estudos hoje em dia, de neuropsicologia, que vão fazendo o mapeamento das ondas cerebrais, mostram que uma pessoa em situação de estresse, se ela pega um gatinho ou um cachorrinho no colo e começa a fazer carinho, as ondas acalmam. Se você pensar em uma criança que está em casa, estressada, mais fechada, pensando agora dentro do contexto de pandemia, com aulas híbridas, em um intervalinho, não tem um recreio, por exemplo, como costumava ser, porque mesmo nas aulas presenciais o recreio está mais controlado, a criança vai brincar, joga bolinha com o cachorro, desestressa muito. Acaba criando um contexto lúdico, porque o cachorro está sempre pronto para brincar. A gente aprende a ter um olhar para o outro e esse é o grande desenvolvimento”. Natércia afirma que a gente nasce muito egocêntrico, só lidando com as nossas necessidades: “Todo processo de desenvolvimento é esse despertar do olhar para o outro, de como eu me relaciono, como é que o outro, o que eu faço, como eu chego. Às vezes, eu falo com um tom de voz e o cachorro assusta. O que eu faço afeta o outro”.
O corpo
Como um pet pode ajudar no desenvolvimento físico das crianças? Estamos todos mais sedentários e a obesidade infantil é um problema mundial. Com os bichinhos, as crianças ficam mais ativas? A psicóloga pondera e responde que podem ficar e podem não ficar por causa da quantidade de famílias que dizem que querem um cachorro pequeno para ficar no apartamento e não precisar passear. Ela analisa: “Aí você já pensa que ela quer um cachorrinho para formar uma família sedentária. Mas pode ajudar e muito no passeio, e o momento do passeio pode ser extremamente prazeroso. Se a família tiver essa postura, de que independentemente do tamanho, e a gente luta muito por isso, como protetor animal, independentemente do tamanho, o cachorrinho tem que passear, e colocar o filho para passear, ter a rotina do passeio, e qual passeio o filho vai junto, mesmo que um adulto tenha que ir”. Já sobre o pentear, ela diz que se a gente pensar nos movimentos de pentear o cachorro, cuidar do cachorro, ajudar a dar remédio, tudo isso tem a questão toda da motricidade. E além da brincadeira, além de brincar com o cachorro, hoje em dia existem tantos tutoriais para a criança aprender a fazer brinquedos mais sustentáveis em casa usando garrafa pet, usando meia, bolinhas que estejam gastas, conta Natércia. Segundo ela, isso também acaba virando um momento de recreação, da criança construir o brinquedo para o cachorro e pensa na satisfação? O cachorro adorar o brinquedo que ela fez. E aí, acrescenta a psicóloga, tem a frustração, porque depois de um tempo o cachorro vai destruir o brinquedo que a criança fez. Para Natércia, todo esse processo é rico e envolve o desenvolvimento, mas vai depender muito da forma como a família lida. Ela diz que a criança vai descobrindo o que ela posso, porque o cachorrinho faz parte da família, o que o pequeno pode ir assumindo de responsabilidade dentro da idade dele. E incluir sempre no processo, mas é importante ir pensando de acordo com o desenvolvimento da criança, orienta ela. “O filho de 7 anos fala eu quero um cachorro e aí você diz: ‘Eu dou se você der comida, limpar o cocô, passear’. Não vai conseguir, porque não vai nem conseguir lembrar. A não ser que você fale, vamos estipular, eu vou lembrar, mas vai ter um trabalho dos responsáveis”.
Natércia tem dois filhos, o Eduardo, de 19 anos, e o Ricardo, de 16. E tem muitos bichinhos. Fora os do abrigo, em casa, ela tem três cachorros, o Logan, a Tequila e a Maggie, quatro gatos, o Koda, a Bonnie, a Mimi e o Alluka, e dois porquinhos-da-índia. Com toda essa convivência, a psicóloga responde se o contato com os animais pode deixar a vida mais longa, saudável e feliz. Sem dúvida, afirma ela. “Eu tenho o testemunho dos meus filhos adolescentes, fechados em casa em pandemia, falando o que teria sido dessa fase das nossas vidas sem os nossos pets. Não dá nem para imaginar, ressalta ela.
A psicóloga conta que o Projeto Amor de Pet, que tem três anos e meio, resgata e faz todo o cuidado que precisa para melhorar a saúde dos animais, vacinar e castrar, vermifugar e quando tem traumas muito fortes, que impedem a adoção, a ONG também trabalha a parte comportamental deles. Ela diz que é um abrigo pequeno, que fica com 10 a 15 cachorros e até 10 gatos, por vez: “A gente costuma fazer feiras de adoção, mas agora com a pandemia tem sido tudo através da internet, Facebook, Instagram, Zoom, entrevistas". Nesse período, a ONG já tive mais de 400 resgates e adoções. O Instagram para quem quiser conhecer a iniciativa é o @projetoamordepet.
Natércia é autora do livro Mulher Sem Script, um sucesso que traz reflexões de como as mulheres podem se livrar das amarras impostas a elas . “A gente pegou uma mudança muito grande do lugar da mulher, nessa última geração, e como a gente pode levar isso e construir a própria história, se desvencilhando de expectativas, construções pesadas que vem socialmente. Tentar olhar para a mulher de uma forma mais leve. E brincando também muito, com uma leveza, e podendo falar que é difícil ser mãe, é sofrido, é puxado, às vezes a gente também não aguenta, então, de ter um olhar muito mais real de ser mulher, que a gente acostumou e aprendeu a ter”, relata ela.
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