Leandro Karnal, Ignácio de Loyola Brandão, Marcelo Rubens Paiva, Sérgio Augusto e Humberto Werneck comentam o que de melhor eles leram em 2020, na quarentena
21 de dezembro de 2020
A quarentena foi um tempo de ainda mais leitura para os colunistas do Estadão. Ficção, não ficção. Sobretudo, livros que ajudam a entender o Brasil. Livros que ajudam a escrever novos livros. Nada passou batido pelo olhar dos nossos colunistas, que contam agora um pouco sobre suas leituras no período do isolamento social e sugerem livros (quase todos de 2020) para ler ainda este ano ou em 2021.
O escritor Ignácio de Loyola Brandão, imortal da Academia Brasileira de Letras, conta que leu muito de março para cá. Com os eventos literários presenciais cancelados, sobrou mais tempo para colocar a leitura em dia. “Li bastante este ano. Devorei tudo de Rosa Montero. Mas nenhum livro me impressionou tanto quanto A Organização: A Odebrecht e o Esquema de Corrupção que Chocou o Mundo, de Malu Gaspar”, diz.
Marcelo Rubens Paiva também indica livros que ajudam a entender “o confuso Brasil”. Sua primeira sugestão aos leitores é A Máquina do Ódio: Notas de Uma Repórter Sobre Fake News e Violência Digital, de Patrícia Campos Mello.
Leandro Karnal, que dedicou uma coluna recente a dicas de leitura, conta agora que entre os livros que o fizeram pensar este ano está Guerra Pela Eternidade: O Retorno do Tradicionalismo e a Ascensão da Direita Populista, de Benjamin R. Teitelbaum.
Sérgio Augusto também dedicou sua leitura no isolamento a obras “com forte ressonância em desgraças correntes”. Tempos Ásperos, de Mario Vargas Llosa, também colunista do Estadão, é um dos melhores livros de 2020 em sua opinião.
Humberto Werneck, mergulhado na pesquisa para a sua biografia de Carlos Drummond de Andrade, portanto, seguindo todo e qualquer rastro do poeta em outros livros, sugere, para o leitor que queira conhecer mais Drummond, Amor Nenhum Dispensa Uma Gota de Ácido, reunião dos escritos do autor sobre “a tremenda pedra no caminho dos modernistas que foi Machado de Assis”.
Veja os melhores livros na opinião de cinco colunistas do Estadão
Ignácio de Loyola Brandão
Li bastante este ano. Devorei tudo de Rosa Montero. Mas nenhum livro me impressionou tanto, me deixou tão fascinado, deslumbrado, irritado, com ânsia de vômito quanto A Organização, de Malu Gaspar. A corrupção, a falta de ética, de decência, de retitude, de correção, de compostura, a ausência de moral, de princípios dos empreiteiros, dos governos, políticos, ministros, lobistas. Chega um momento que nos enoja os rios subterrâneos de dinheiro correndo, comprando tudo e todos. Se não for o melhor livro do ano, se não provocar polêmica, discussão, algo de muito estranho ocorre neste Brasil. Tudo está escancarado aqui, com provas.
- A Organização: A Odebrecht e o Esquema de Corrupção que Chocou o Mundo
Autora: Malu Gaspar
Editora: Companhia das Letras (2020)
(640 págs.; R$ 99,90; R$ 39,90 o e-book)
Leia as colunas de Ignácio de Loyola Brandão.
Sérgio Augusto
Recomendo três títulos: um romance histórico e dois livros de não ficção, todos de cunho político, com forte ressonância em desgraças correntes ou que "conversam com o tempo presente", como outros talvez prefiram dizer.
A Bailarina da Morte, de Lilia M. Schwarcz e Heloisa M. Starling. Como a Gripe Espanhola, o covid-19 do século passado, chegou ao Brasil, a bordo de um navio, em 1918, aqui se disseminou e em questão de meses fez 50 mil vítimas fatais numa população de menos de 30 milhões de habitantes. Escrito durante a pandemia ainda em curso, ilumina outro momento dantesco de nossa história, de nosso descalabro sanitário, quando também a negação da ciência e a crença absurda em curas milagrosas expuseram a ignorância letal das autoridades e da população e escancararam ainda mais nossas seculares desigualdades sociais.
- A Bailarina da Morte
Autoras: Lilia M. Schwarcz e Heloisa M. Starling
Editora: Companhia das Letras (2020)
(368 págs.; R$ 59,90; R$ 29,90 o e-book)
Tempos Ásperos conta a história do primeiro golpe de Estado articulado pela Casa Branca na América Latina e seus dois protagonistas: Jacobo Árbenz Guzman, presidente honesto e nacionalista da Guatemala, e o ressentido e corrupto tenente-coronel Carlos Castillo Armas, que à frente de uma tropa de mercenários patrocinados pela CIA e a serviço dos interesses monopolistas da United Fruit, derrubou Guzman em 1954. Bom romance histórico, na linha de A Festa do Bode, em que Vargas retratou a ditadura de outro militar bananeiro, o general Rafael Trujillo, da República Dominicana. A Guatemala nunca se recuperou das sequelas daquele golpe militar. Castillo Armas inaugurou uma dinastia de ditadores fardados, que não parece ter fim.
- Tempos Ásperos
Autor: Mario Vargas Llosa
Editora: Alfaguara (2020)
(280 págs.; R$ 59,90; R$ 34,90 o e-book)
The Jakarta Method é um ensaio histórico de alto nível cujo subtítulo impressiona pelo tamanho e pela abrangência: “A cruzada anticomunista de Washington e o programa de extermínio em massa que mudou o mundo”. Jacarta foi o maior laboratório de atrocidades cometidas em defesa da democracia, dos valores cristãos ocidentais e dos interesses geopolíticos e econômicos dos EUA. Com muita pesquisa fresca, o americano Vincent Bevins, correspondente internacional em diversos países, inclusive no Brasil, detalha a implantação, em meados da década de 1960, de um método de combate ideológico e guerra suja que seria responsável por alguns banhos de sangue entre 1945 e as últimas décadas do século passado, na Ásia e na América Latina. O golpe militar de 1964 no Brasil foi parte daquela cruzada. Merecia ser traduzido entre nós. De preferência ainda no governo Bolsonaro.
- The Jakarta Method
Autor: Vincent Bevins
Editora: Public Affair Books (2020)
(320 págs.; R$ 155,73; R$ 65,18 o e-book; em inglês)
Veja aqui as colunas de Sérgio Augusto.
Marcelo Rubens Paiva
Todos esses livros ajudam a entender o confuso Brasil, com sua tragédia secular.
- A Máquina do Ódio: Notas de Uma Repórter Sobre Fake News e Violência Digital
Autora: Patrícia Campos Mello
Editora: Companhia das Letras (2020)
(292 págs.; R$ 39,90; R$ 27,90 o e-book)
- Enquanto Houver Champanhe, Há Esperança: Uma Biografia de Zózimo Barroso do Amaral
Autor: Joaquim Ferreira dos Santos
Editora: Intrínseca (2016)
(672 págs.; R$ 69,90; R$ 14,90 o e-book)
- Enterre Seus Mortos
Autora: Ana Paula Maia
Editora: Companhia das Letras (2018)
(136 págs.; R$ 34,90; R$ 23,90)
- Poesia Completa
Autor: João Cabral de Mello Neto
Editora: Alfaguara (2020)
(896 págs.; R$ 154,90; 49,90 o e-book)
- A Bailarina da Morte
Autoras: Lilia M. Schwarcz e Heloisa M. Starling
Editora: Companhia das Letras (2020)
(368 págs.; R$ 59,90; R$ 29,90 o e-book)
- Brasil Paraíso Restaurável
Autores Jorge Caldeira, Julia Marisa Sekula e Luana Schabib
Editora: Estação Brasil (2020)
(352 págs.; R$ 69,90; R$ 39,90)
- Samuel Weiner
Autora: Karla Monteiro
Editora: Companhia das Letras (2020)
(576 págs.; R$ 89,90; R$ 39,90)
Confira as colunas de Marcelo Rubens Paiva.
Leandro Karnal
Indico os livros mais recentes que me fizeram pensar:
- Guerra Pela Eternidade: O Retorno do Tradicionalismo e A Ascensão da Direita Populista
Autor: Benjamin R. Teitelbaum
Editora: Unicamp (2020)
(288 págs.; R$ 66)
- Brasil
em Projetos: História dos Sucessos Políticos e Planos de Melhoramento
do Reino – Da Ilustração Portuguesa à Independência do Brasil
Autor: Jurandir Malerba
Editora: FGV (2020)
(748 págs.; R$ 94; R$ 63 o e-book)
- A coleção de traduções interlineares de Shakespeare
Tradução: Elvio Funck
Editoras: Movimento/EDUNISC
Vários volumes
E as biografias:
- Churchill: Caminhando com o Destino
Autor: Andrew Roberts
Editora: Companhia das Letras (2020)
(1.200 págs.; R$ 129,90; R$ 49,90 o e-book)
- Charles de Gaulle: Uma Biografia
Autor: Julian Jackson
Editora: Zahar (2020)
(1.080 págs.; R$ 139,90; R$ 49,90 o e-book)
- Eu Sou Dinamite: A Vida de Friedrich Nietzsche
Autora: Sue Prideaux
Editora: Crítica (2019)
(440 págs.; R$ 99,90; R$ 79,90 o e-book)
Leia as colunas de Leandro Karnal.
Humberto Werneck
Uma de minhas boas leituras em 2020 foi Amor Nenhum Dispensa uma Gota de Ácido, reunião dos escritos de Carlos Drummond de Andrade sobre a tremenda pedra no caminho dos modernistas que foi Machado de Assis. Por que pedra no caminho? Esbordoar parnasianos era fácil, mas o que fazer com o maior de nossos escritores? Drummond sempre admirou Machado, mas no ardor dos 20 anos fez pingar sobre ele mais de "uma gota de ácido", por considerá-lo um "entrave à obra de renovação da cultural geral". A coletânea organizada por Hélio de Seixas Guimarães permite acompanhar, ao longo de décadas, o processo em que Drummond, a princípio com dois pés atrás, aos poucos se rendeu à paixão machadiana, por fim escancarada no poema A um bruxo, com amor.
- Amor Nenhum Dispensa uma Gota de Ácido
Autor: Carlos Drummond de Andrade
Org.: Hélio de Seixas Guimarães
Editora: Três Estrelas (2019)
(160 págs.; R$ 44,90)
Gostei também, e muito, de reler O Observador no Escritório, diários de Drummond publicados em vida e que ganharam neste ano nova edição, para a qual, aliás, escrevi um posfácio. Reedição no capricho, pois, além de pequenos acertos, traz indispensável índice onomástico. Sua leitura nos conduz de modo natural a mais diários do poeta, ao fascinante Uma Forma de Saudade", saído da gaveta faz uns poucos anos, e que, carregado de informações por vezes cruas, não teve ainda a atenção que por certo merece.
- O Observador no Escritório
Autor: Carlos Drummond de Andrade
Editora: Companhia das Letras (2020)
(272 págs.; R$ 79,90; R$ 39,90 o e-book)
Leia as colunas de Humberto Werneck.
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