MEIO AMBIENTe
Recuperar cobertura vegetal de áreas de
pastagem pode reduzir emissões de metano e impactos da pecuária para o clima,
diz estudo. Estima-se que até 80% das áreas desmatadas da Amazônia sejam
utilizadas como pasto.
Um dos impactos ambientais mais
conhecidos da atividade pecuária é a emissão de gases poluentes causadores do
aquecimento global, fenômeno que contribui para o aumento da temperatura média
da Terra.
Um recente estudo do Centro de
Energia Nuclear na Agricultura (CENA), da Universidade de São Paulo (USP),
sobre a Amazônia indica que recuperar áreas degradas usadas como pastagem
pode reduzir as emissões de metano, produzido pela decomposição de matéria
orgânica e que é um dos gases do efeito estufa.
"Concluímos que o manejo
adequado da pastagem na Amazônia, visando manter a cobertura vegetal do solo,
pode reduzir as emissões de metano gerado na atividade pecuária", afirma o
biólogo e doutorando do Cena-USP Leandro Fonseca de Souza, que desenvolveu
a pesquisa, analisando emissões e micro-organismos no solo da Amazônia.
O biólogo explica
que tanto micro-organismos produtores quanto micro-organismos
consumidores de metano habitam os solos. "Nos solos de floresta, há mais
consumidores e, nos solo de pastagem, há mais produtores. Observamos que,
em um pasto bem cuidado, as raízes das gramíneas reduzem a quantidade de
micro-organismos que produzem metano, e há mais consumo que produção do gás."
Segundo Souza, estimativas
existentes apontam que de 60% a 80% das áreas desmatadas da Amazônia são
utilizadas como pasto, e de 40% a 60% delas estão degradadas em algum
nível.
"Áreas de pasto degradadas na
Amazônia são um problema tanto para o produtor quanto ambiental, pois se tornam
terras improdutivas e também deixam de oferecer os serviços ecossistêmicos de
uma floresta [funcionamento e a regulação naturais do meio ambiente essenciais
para os seres humanos]", explica.
Em agosto, o projeto MapBiomas, uma
parceria entre universidades, ONGs e empresas de tecnologia que monitora a
cobertura e uso da terra no país, divulgou que de cada 10 hectares desmatados
na Floresta Amazônica, um é usado para agricultura, urbanização ou
mineração; três são abandonados; e seis viram pasto.
O monitoramento também mostrou
que a abertura de pastagens tem se intensificado na Amazônia Legal. Em
2005 havia 45 milhões de hectares de pastos na região, e em 2018 já eram 53
milhões de hectares.
A busca por novas áreas de pastagens
que avançam sobre a Floresta Amazônica pode estar associada à acidez do
solo da região, ruim para pastagem.
"Pastagens na região amazônica
têm solos pobres em nutrientes, dada sua origem em solos onde antes havia
floresta, sendo normalmente solos mais ácidos e com altos níveis de
alumínio", afirma Souza, explicando que solos dessa região tendem a se
degradar mais facilmente quando pastos são mal conservados.
Outra explicação para a procura
por novas áreas a serem exploradas é o fator econômico. "O processo
de recuperação de um solo degradado é custoso, exigindo tempo e recursos",
explica Souza.
O engenheiro agrônomo e pesquisador
da Embrapa Moacyr Bernardino Dias Filho também aponta a recuperação de
áreas degradadas na Amazônia como a melhor solução.
"A pecuária na região amazônica
é importante para preservar a segurança alimentar regional e nacional. No
entanto, não há mais condições dessa atividade ser desenvolvida de forma
amadora", afirma.
"Em termos numéricos, para cada
hectare de pastagem em degradação recuperada na Amazônia, cerca de três
hectares poderiam ser liberados para outros fins: agrícolas, florestais ou de
preservação, sem que com isso houvesse perda dos níveis atuais de produção de
carne ou leite da região", aponta Dias Filho.
Acordo de Paris
O Brasil possui o maior rebanho
comercial bovino do mundo, com cerca de 209 milhões de cabeças de gado, de
acordo com dados de 2016 da Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras
de Carnes (Abiec).
A posição faz com que o país seja
considerado pelo Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC) um dos
maiores contribuintes nas emissões de gases do efeito estufa, principalmente do
metano, um gás poluente produzido em locais como aterros sanitários, lixões e
pastagens. Seu poder de provocar o aquecimento global é 21 vezes maior que o do
dióxido de carbono, gás poluente usado como base para medir emissões.
Em 2015, durante a reunião da Cúpula
da ONU sobre o Desenvolvimento Sustentável, o Brasil se comprometeu a reduzir
as emissões de gases do efeito estufa em 43% até 2030.
A recuperação de pastagens com solos
degradados é uma das metas do Brasil no Acordo de Paris: para reduzir suas
emissões, o país se comprometeu a recuperar mais de 15 milhões de hectares de
pastagens degradadas até 2030.
"Pastagens produtivas, ou seja,
bem manejadas, são muito eficientes em acumular carbono, sendo inclusive,
capazes de armazenar esse elemento no solo em quantidades superiores àquelas
armazenadas no solo da floresta nativa", explica Dias Filho.
"Assim, as pastagens tropicais
são um sistema de uso da terra bastante eficaz em sequestrar o CO2 atmosférico,
tendo, portanto, papel importante em mitigar as emissões de gases efeito
estufa."
Para o engenheiro agrônomo, porém,
para essa meta ser alcançada, é preciso haver incentivo técnico e econômico do
governo na região amazônica, para que haja uma transição da atividade pecuária
amadora para a profissional.
"É preciso apoio governamental à
geração de tecnologia na pecuária, mediante o fortalecimento das instituições
de pesquisa e ensino superior na Amazônia. Da mesma forma, o governo deveria
priorizar uma política atraente de financiamento de custos para produtores
menos capitalizados, objetivando a adoção dessa tecnologia, assim como
fortalecer a assistência técnica pública para esses mesmos produtores",
defende Dias Filho.
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