terça-feira, 22 de junho de 2021

Latino-americanos mais ricos deveriam pagar muito mais imposto, diz FMI

Financial Times

Principal diretor da entidade para a América Latina argumenta que inquietação da sociedade reforça necessidade de distribuição de renda mais igualitária


Michael Stott
 
Londres | Financial Times

O principal dirigente do FMI (Fundo Monetário Internacional) para a América Latina instou os governos latino-americanos a fazer com que os ricos paguem “muito mais” impostos, dizendo que a região mais desigual do planeta não vai se desenvolver a não ser que atenda às demandas por um sistema econômico muito mais justo.

Em entrevista ao Financial Times enquanto se prepara para deixar o posto que ocupou por oito anos, Alejandro Werner, diretor do FMI para o hemisfério ocidental, disse que as recentes inquietações sociais na América Latina destacam a necessidade de uma distribuição de renda muito mais igualitária.

O FMI já havia apelado anteriormente para que as pessoas de alta renda de todo o planeta, que prosperaram por conta da pandemia, paguem mais impostos, temporariamente, a fim de ajudar os mais prejudicados.

A América Latina sofreu mais do que qualquer outra região, porque o coronavírus exacerbou problemas duradouros de baixo crescimento, alta desigualdade e pobreza.

Alejandro Werner, principal dirigente do FMI para a América Latina - Luisa Gonzalez - 28.out.19/Reuters

Werner identificou os impostos imobiliários “subutilizados” como um bom ponto de partida para a América Latina.

“É preciso adotar um sistema de tributação muito mais progressivo na região sob o qual os segmentos mais abastados da população paguem mais, e em seguida criar um sistema econômico no qual a competição seja muito maior do que é hoje”, ele disse.

“A América Latina não pode ser a região mais desigual do planeta e ao mesmo tempo avançar para o próximo estágio de desenvolvimento econômico”.

Antes de se transferir ao FMI, em 2013, Werner era funcionário de primeiro escalão do Ministério das Finanças mexicano, e trabalhou em um banco do México. Ele vai deixar seu posto no Fundo no final de agosto.

Os efeitos colaterais das medidas de estímulo dos Estados Unidos, o forte crescimento da China e os preços altos das commodities em todo o mundo ajudaram a região a obter uma recuperação mais rápida do que se esperava, depois da queda de 7% em seu PIB (Produto Interno Bruto) no ano passado, e o FMI, bem como economistas do setor privado, está mais otimista com relação às perspectivas latino-americanas.

Werner declarou que a atual projeção do FMI de um crescimento de 4,6% para a América Latina este ano deve ser revisada para mais, em parte porque as economias foram capazes de manter atividade econômica superior à esperada, a despeito do contágio continuado pela Covid.

“A correlação entre a atividade econômica e o ritmo de contágio é bem mais fraca agora do que no segundo trimestre do ano passado”, ele disse.

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As duas maiores economias da região, Brasil e México, deram prioridade a reabrir suas economias apesar do número elevado de mortes, o que as ajudou a registrar recuperação mais rápida do que os países vizinhos, que persistiram com os lockdowns.

Um estudo do Financial Times sobre mortalidade excedente constatou que países da América Latina registraram alguns dos índices mais elevados de mortalidade com a pandemia no planeta, e que a diferença entre os países que impuseram lockdowns severos, como o Peru e a Colômbia, e aqueles que não o fizeram, como o Brasil e o México, é relativamente pequena.

Os países latino-americanos também adotaram caminhos divergentes em termos de gastos adicionais, com Brasil, Peru e Chile entre os governos que assumiram carga substancial de dívida adicional a fim de apoiar as pessoas mais atingidas pelo coronavírus.

O México foi a exceção mais notável, e ainda que os bancos de Wall Street projetem, que o país crescerá mais de 5% este ano, isso não compensará a contração de mais de 8,5% registrada no ano passado. Werner disse que o México “teria sido muito mais bem servido” por um pacote de estímulo.

A política da região vem sendo turbulenta nos últimos anos, com ondas de protestos de rua abalando o Chile e o Equador em 2019. O Peru e, mais recentemente, a Colômbia também registraram protestos, o que polarizou a política e reforçou a posição de candidatos “outsiders” da extrema esquerda e da extrema direita, nas eleições.

No Peru, Pedro Castillo, candidato de um partido político marxista-leninista, parece ter vencido a eleição presidencial deste mês, ainda que sua oponente conservadora, Keiko Fujimori, tenha contestado a vitória dele e lançado acusações de fraude eleitoral.

“A oscilação que vemos nas escolhas políticas da população reflete a existência de uma forte demanda por um sistema muito melhor de distribuição de renda e, além disso, por um sistema econômico e social muito mais justo”, disse Werner.

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Em abril, a Colômbia tentou uma reforma tributária para ampliar sua arrecadação e alargar sua base tributária, mas o governo foi forçado a abandoná-la depois de apenas alguns dias, por conta de uma onda de protestos violentos em todo o país.

Werner disse que mudanças com o objetivo de elevar a arrecadação tributária eram necessárias para reparar as finanças públicas da região, mas acrescentou que a experiência de Bogotá demonstrava a necessidade de um acordo amplo sobre relações econômicas, que fosse além da classe política tradicional.

“O ambiente político é muito difícil para a implementação de reformas, e portanto os países terão de ser muito cuidadosos ao estruturá-las, promovendo o engajamento da população em geral e por fim gerando um consenso porque essas reformas são necessárias”, ele disse.

“Caso isso não aconteça, veremos instabilidade significativa que prejudicará o emprego, prejudicará a recuperação, prejudicará os indicadores sociais. É um cenário muito difícil”.

Traduzido originalmente do inglês por Paulo Migliacci



















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