O
sexo feminino está autorizado a conduzir automóveis a partir de 2018.
Mas muitas outras restrições continuam a bloquear o seu lugar e papel na
sociedade da Arábia Saudita.
O
fim da proibição de as mulheres conduzirem na Arábia Saudita, anunciada
na terça-feira e considerada uma decisão "histórica" pelas ativistas
que desde há décadas se têm manifestado contra a medida, é apenas uma
das restrições ao papel das pessoas do sexo feminino neste país. A
proibição cessa em junho de 2018.
Para
Manal al-Sharif, de 38 anos, que em 2011 colocou no YouTube um vídeo
seu a conduzir na Arábia Saudita, ouvida ontem pela Reuters, se a
decisão de terça-feira é fundamental, permanecem muitos obstáculos à
afirmação das mulheres na Arábia Saudita e ao papel que o documento
Visão Saudita 2030 lhes reserva. Apresentado em 2016 e considerado
instrumento central para a concretização das reformas defendidas pelo
príncipe herdeiro Mohammad bin Salman, nele se estabelece o aumento de
"22% para 30% de participação de mulheres na força de trabalho". E se no
plano dos desafios a ultrapassar, como se nota no documento, "mais de
50% das mulheres têm curso universitário", o seu estatuto no país é em
muitos aspetos equivalente ao de um cidadão de segunda.
O
caso mais flagrante para Al-Sharif é o do estatuto de guardião que
concede aos homens a tutela de toda uma série de decisões respeitantes à
vida das mulheres. "É preciso abolir o estatuto de guardião. Ponto
parágrafo. Não é possível as mulheres serem ou fazerem algo no país se
elas estão dependentes da autorização de um homem", afirmou a ativista.
Segundo
o estatuto do guardião ou tutor, é necessária a aprovação de um
indivíduo do sexo masculino em casos como autorização para casar,
viajar, obter passaporte e, em certas situações, para tratamentos
médicos e arranjar emprego.
Uma
outra importante restrição é o acesso ao mercado de trabalho, que
formalmente deixou de exigir o assentimento masculino, com as mulheres a
conseguirem entrar em setores como o do controlo aéreo ou Medicina,
antes reservado aos homens. Neste ponto, continuam a não poder ocupar-se
de doentes masculinos. Contudo, na maioria das empresas continua a
exigir-se prova de autorização masculina e as posições de chefia são
todas desempenhadas por homens. A Reuters referia ontem que em muitas
empresas não existem sequer casas de banho para mulheres e a quase
totalidade pratica a segregação absoluta entre os dois sexos.
Terceiro
desafio relaciona-se com os limites jurídicos de que as mulheres são
alvo, nomeadamente o facto de em tribunal o seu testemunho ser menos
valorizado do que um masculino. Só a partir de 2013 é que se tornou
possível criarem escritórios de advocacia e representar clientes em
tribunal.
Ainda no plano
legal, embora as mulheres possam adquirir propriedades e tenham bens
próprios, é-lhes dificultado muitas vezes o acesso à compra ou
arrendamento de casas. Encontram-se também em posição de inferioridade
no direito de herança.
Quinto
desafio, e questão especificamente abordada na Visão Saudita 2030, é o
de acesso das mulheres à prática de desporto, "oportunidade muitas vezes
limitada no passado", como se lê no documento. Educação Física só
começou a ser ministrada neste ano letivo e a autorização para a
abertura de ginásios femininos foi feita em julho.
No
plano social, existe uma política estrita de segregação entre homens e
mulheres. Estas estão restritas a áreas específicas em restaurantes e
salas de espetáculos, a não ser que estejam em família, e em eventos
públicos. Não podem assistir a jogos de futebol e só no passado dia 23, a
coincidir com o dia nacional, é que foram autorizadas a estar entre
homens num estádio para assistir às cerimónias que assinalaram a data.
Finalmente, vigora um rigoroso código de indumentária, com as mulheres
forçadas a usarem uma longa túnica escura, a abaya, e ainda um véu a
cobrir-lhe o rosto. E mudanças nestas áreas não surgem como fáceis ao
quadro religioso-cultural da Arábia Saudita.
Como
sintetizava Al-Sharif nas declarações à Reuters, "há um desafio real a
vencer. Como vão ser aceites as mulheres como pessoas de cidadania
absoluta e a exercer os seus direitos".
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