Segundo organização, deficit previdenciário de seis países somará US$ 225 trilhões em 2050 se não forem aplicadas mudanças como aumento da idade de aposentadoria para 70 anos.
Equilibrar as contas da Previdência, desafio que está no centro do
debate da reforma brasileira, é uma tarefa bem maior para as nações
desenvolvidas. O deficit previdenciário de seis grandes economias
mundiais poderá chegar a US$ 225 trilhões (R$ 733 trilhões) na metade do
século, três vezes o valor do PIB global hoje, segundo o Fórum
Econômico Mundial (FEM).
Os seis países com os maiores sistemas de pensão do mundo - em termos
de investimento total em fundos de pensão -, Estados Unidos, Reino
Unido, Japão, Holanda, Canadá e Austrália estão sentados numa
"bomba-relógio" que poderá provocar a "maior crise previdenciária da
história", diz um relatório divulgado recentemente.
O estudo compara o quadro da situação previdenciária com o das mudanças
climáticas. "Temos que tratar disto agora ou aceitar que as
consequências adversas assombrarão as gerações futuras", escreveu o
diretor de sistemas financeiros e de infraestrutura do FEM, Michael
Drexler.
Se incluídos os países mais populosos - China e Índia -, o deficit dos
países, que atualmente é de US$ 70 trilhões (R$ 230 trilhões), passará
para US$ 400 trilhões (R$ 1,3 quatrilhão) em 2050, valor cinco vezes
maior que o da economia global.
O cálculo do deficit previdenciário feito pelo FEM inclui gastos dos
governos, investimentos de trabalhadores e empregadores em fundos de
pensões e aplicações.
Expectativa de vida
Pessoas nascidas hoje nos seis países analisados terão uma expectativa
de vida acima de 100 anos, o que reduzirá pela metade a proporção de
trabalhadores por aposentados - hoje ela é de oito para um; em 2050,
será de quatro para um.
O aumento da longevidade aumenta, também, o tempo em que as pessoas
recebem o benefício da aposentadoria. No Japão, por exemplo, que terá a
mais alta expectativa de vida - de 107 anos -, as pessoas se aposentam
aos 60 anos, o que significa que poderiam receber aposentadoria por mais
de 45 anos, um período maior que o tempo de contribuição.
Uma consequência óbvia de se viver mais, diz o documento, é que as
pessoas terão que trabalhar por mais tempo. A organização sugere que a
idade para aposentadoria seja de pelo menos 70 anos em 2050 nos países
com expectativa de vida acima dos 100 anos.
Alguns desses países já preveem revisão da idade da aposentadoria, mas
em nenhum dos casos, por enquanto, para acima de 70 anos.
No Brasil, a expectativa de vida projetada para 2050 pelo Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) é de 80,7 anos. O estudo do
FEM não inclui o país, mas Michael Drexler, um dos editores do estudo,
disse à BBC Brasil que a situação no país é menos preocupante.
"Os países que analisamos, como Japão e China, têm a demografia como o
principal gerador (do deficit); na China, por causa da política do filho
único
,
e no Japão, por conta da tendência de envelhecimento. Já o Brasil, do
ponto de vista demográfico, parece ter uma situação mais esperançosa",
afirmou Drexler.
A atual proposta do governo brasileiro para a reforma da Previdência
estabelece a idade mínima de 65 anos para homens e 62 para mulheres, e 5
anos de contribuição para aposentadoria com 70% do valor da
aposentadoria. Para se aposentar com valor integral, o tempo de
contribuição seria de 40 anos. Há regras diferentes ainda para o regime
de transição; a reforma prevê poucas alterações no caso de militares e
servidores públicos. Em 2016, o deficit previdenciário do governo
brasileiro foi de R$ 227 bilhões, 3,5% do PIB do país.
O porta-voz do FEM evitou comentar especificamente sobre a reforma
proposta pelo governo de Michel Temer. Ele ponderou que, em linhas
gerais, o aumento da idade de aposentadoria é uma das medidas possíveis
quando existe um deficit previdenciário. "Mas seria simplista demais
dizer que o Fórum Econômico Mundial defende apenas a extensão do tempo
de trabalho (para nações com esse deficit)", acrescentou.
Ele também diz que o estudo não levou em conta as características
específicas de cada país, e sim, equacionou alguns pontos centrais para
eventualmente serem debatidos pelos legisladores.
Acesso à aposentadoria
O FEM alerta, também, que metade dos trabalhadores no mundo são
informais ou de setores desorganizados que não contribuem com programas
de previdência e que acabam fragilizando ainda mais o sistema; e que 48%
da população na idade de se aposentar não recebe aposentadoria.
Essa é uma característica da Índia, onde a cada dez trabalhadores, nove
são informais, segundo o FEM. No Brasil, dados do Ministério do
Trabalho divulgados em 2015 indicavam que 56% dos empregos no país eram
formais.
"O desafio da Índia, portanto, não é demográfico; ele decorre da grande
economia informal, cujos indivíduos não têm acesso ao sistema
previdenciário. E no caso do Brasil, esta também seria uma preocupação,
não tão grande quanto na Índia, mas um dos desafios do governo", afirmou
Drexler.
A falta de acesso ao sistema previdenciário também preocupa em algumas
economias desenvolvidas, segundo Han Yik, chefe de Investidores
Institucionais do FEM.
"Até mesmo em Nova York, 57% dos trabalhadores não têm acesso a planos
de pensão, ou porque são autônomos ou porque ganham abaixo do limite
permitido para sua empresa incluí-lo no esquema", diz.
Por isso, outra recomendação do FEM é criar políticas para melhorar o
acesso aos planos de aposentadoria, especialmente do trabalhador
informal, autônomo e daqueles com contratos flexíveis.
Responsabilidade do trabalhador
Para calcular o deficit previdenciário do relatório, o FEM usou médias
baseadas em aposentadorias pagando 70% do último salário, o que está de
acordo com recomendações internacionais para manter o padrão de vida do
aposentado.
Isso pressupõe contribuições de diferentes fontes: do governo, dos
fundos de pensão do empregador (público ou privado) e dos investimentos
de cada indivíduo. Na maioria dos países pesquisados - com exceção, por
exemplo, da Holanda -, o idoso teria a aposentadoria do governo e a
complementaria com outros ganhos para atingir os 70%.
O FEM entende que o trabalhador terá progressivamente mais
responsabilidade sobre a sustentabilidade de sua aposentadoria, através,
por exemplo, de aplicações financeiras.
Por isso, o FEM cobra mais iniciativas para a educação financeira dos
trabalhadores, especialmente dos mais vulneráveis, em lidar com esses
investimentos.
No exemplo do Brasil, Drexler ressalta que, embora o sistema bancário
seja desenvolvido, as opções de produtos financeiros disponíveis à
população são menores do que em países mais desenvolvidos. E que o país
deveria investir mais a educação financeira.
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