Usadas
para fazer brilhar o corpo, a roupa, os acessórios e os trabalhos
manuais, as purpurinas, feitas com microplásticos, acabam no mar,
prejudicando a vida marítima
É
difícil imaginar o Carnaval sem purpurinas. Do corpo à roupa, passando
pelo rosto e o cabelo, o brilho parece ser indispensável para a folia.
Mas não será tão inofensivo como parece. Depois de uma rede de creches
britânica ter proibido o uso de purpurinas e glitter, várias vozes se
levantaram exigindo uma proibição a nível mundial, devido às
consequências negativas que estes produtos podem ter nos ecossistemas.
Atentas ao debate, algumas empresas estão a apresentar soluções
biodegradáveis.
Regra geral,
as purpurinas são feitas com pequenos pedaços de plástico (polietileno
tereftalato - PET) e alumínio. "Estamos a falar de microplásticos
[partículas inferiores a cinco milímetros]. A única maneira de saírem do
corpo é no banho e não há nada que as retenha. Vão parar aos oceanos,
tal como aquelas que são atiradas para o ar acabam por ir", explicou ao
DN Carla Rodrigues Lourenço, bióloga marinha e responsável pela Straw
Patrol, um projeto de sensibilização ambiental, que alerta para a
problemática do lixo marinho.
Trisia
Farrelly, antropóloga do meio ambiente na Universidade Massey na Nova
Zelândia, foi uma das vozes que sugeriram o fim destes brilhantes: "As
purpurinas deviam ser proibidas, porque são microplásticos e todos os
microplásticos acabam no meio ambiente." Ao DN, Carla Graça,
vice-presidente da Zero - Associação Sistema Terrestre Sustentável,
defendeu também que, tratando-se de "produtos fúteis", devem ser
banidos. "Não vemos qualquer utilidade em usar um produto tóxico, com
consequências muito negativas para o meio ambiente e para a saúde
pública, já que a sua recolha e reciclagem são praticamente impossíveis.
Isto vem ao encontro do que temos vindo a pedir: é importante banir os
produtos de uso único e optar-se por produtos reutilizáveis ou que
tenham garantia de biodegradabilidade e segurança em termos de
toxicidade", disse a responsável.
Em
novembro, 19 creches da cadeia britânica Tops Day proibiram o uso de
purpurinas e glitter nos trabalhos manuais das suas salas,
intensificando a discussão. Para Carla Lourenço, proibir pode não ser a
solução indicada, "já que quando se usa esta palavra muita gente acha
mal". "Mas penso que é boa ideia", frisou a bióloga, destacando que "há a
possibilidade de ter purpurinas de forma natural, a partir de folhas
secas das árvores, por exemplo".
Quando
chegam aos oceanos, explicou a especialista, as purpurinas e o glitter,
"que já têm químicos na sua composição, agem como esponjas e absorvem
químicos, poluentes da água do mar". Como são muito pequenas, "são
ingeridas pelos organismos mais pequenos, como o zooplâncton, e a partir
daí vão escalando, acabando por entrar na alimentação humana". Por
exemplo: "O zooplâncton é ingerido por sardinhas, que são comidas por
peixes maiores, que depois são capturados. E os microplásticos chegam,
assim, aos pratos das pessoas. Isto não é raro. Já acontece em
Portugal." Um estudo recente, prosseguiu, demonstrou que um em cada
cinco peixes com interesse comercial tem microplásticos no estômago.
Até
ao momento, ainda não se sabe ao certo qual o impacto que estas
partículas têm na saúde do ser humano. "Mas sabe-se que os plásticos têm
químicos que provocam alterações no organismo ao nível das hormonas e
que podem levar ao desenvolvimento de doenças, portanto é provável que
possa haver um impacto direto na saúde humana", destacou a responsável
pela Straw Patrol.
Além do
plástico que vai parar ao oceano, Carla Graça lembra que as estações de
tratamento de águas residuais "não estão adaptadas para tratar os
microplásticos". Muitos vão parar também aos rios e a aos lagos. Por
isso, insiste, "é necessário que haja pressão da opinião pública e dos
governos para que a indústria dê um passo em frente e altere as suas
práticas, no sentido de encontrar soluções mais sustentáveis".
Alternativas ecológicas
Várias
empresas têm vindo a desenvolver purpurinas e glitter biodegradáveis.
No Brasil, por exemplo, as marcas Viva Purpurina Biodegradável e a
Glitter Ecológico estão a comercializar produtos não tóxicos, que não
prejudicam os ecossistemas. Assim como a EcoStarDust, uma empresa cuja
missão é aumentar a consciencialização sobre questões ambientais,
através da venda de brilho ecológico.
Este
não é, contudo, um problema exclusivo das purpurinas. "Há muita
cosmética que usa microplásticos, por exemplo", lembrou Carla Lourenço.
Nos últimos anos, alguns países proibiram o uso destas pequenas
partículas de plástico em cosmética e produtos de higiene, nomeadamente
em geles de banho, esfoliantes e maquilhagem. Primeiro foram alguns
estados nos Estados Unidos, em 2015, e depois o Reino Unido, já neste
ano, cumprindo uma promessa feita no ano passado. Para já está proibido o
fabrico de cosméticos e produtos de higiene pessoal com microplásticos
e, em julho, é proibida a venda dos mesmos.
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