O
envelhecimento da população mundial é hoje uma realidade. Portugal é um
dos países europeus onde o envelhecimento da população tem uma
expressão mais significativa. De acordo com dados do INE, Portugal
tinha, em 2015, 2,1 milhões de idosos, número que tenderá a crescer de
forma exponencial e que representa um dos maiores crescimentos numa
Europa a 28.
A Organização das
Nações Unidas adotou um conjunto de princípios relativos à proteção das
pessoas idosas através da Resolução n.º 46, de 16 de dezembro de 1991, e
mais recentemente a Assembleia Geral de Nova Iorque, realizada em 30 de
março de 2007, adotou a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com
Deficiência, também abrangendo os idosos, que vão precisamente nesse
sentido.
Dando execução a esta
nova visão, o atual governo assumiu uma clara mudança de paradigma
relativamente à forma de enfrentar este problema, o qual é de natureza
transversal e que convoca respostas em diferentes vertentes.
Esta
nova abordagem assenta em medidas muito concretas, como por exemplo: a
Estratégia Nacional para o Envelhecimento Ativo e Saudável 2017-2025,
que já se encontra em inquérito público; o denominado Estatuto do
Cuidador Informal, pelo qual se procura responder a um problema
gravíssimo, que passa pela criação de condições para quem tem a seu
cargo idosos e cujo projeto foi já apresentado ao Ministério da Saúde; e
a necessária revisão do Código Civil e demais legislação conexa, que
permitirá alterar o paradigma estabelecido no Código Civil de 1966, no
que respeita ao instituto das incapacidades e ao seu suprimento, cujo
anteprojeto de reforma já foi apresentado e que assenta no princípio da
primazia da autonomia do visado e cuja vontade deve ser respeitada e
aproveitada até aos limites do possível, ou seja a figura do "maior
acompanhado" versus o interdito/ inabilitado.
Este
é o momento de prosseguir o caminho que muitos dos sistemas
inspiradores do nosso ordenamento jurídico já fizeram nas últimas duas
décadas e estruturar o nosso ordenamento jurídico-civil com base nos
princípios da preservação máxima da capacidade, da necessidade e da
proporcionalidade, orientados sempre em função do interesse e da
necessidade da pessoa que se pretende proteger, criando um novo regime
de suprimento das denominadas incapacidades dos maiores.
Estas
respostas estão na antítese da ideia que a solução dos problemas
emergentes do envelhecimento e da proteção dos idosos e das pessoas
especialmente vulneráveis passa por uma resposta no plano criminal ou
pela manutenção do quadro vigente do suprimento das incapacidades, ainda
que com algumas soluções de cosmética, como as que estão
consubstanciadas nas propostas que alguns partidos apresentaram na
Assembleia da República e que serão objeto de debate nesta semana.
A
grave situação em que vivem muitos dos idosos portugueses, sem qualquer
apoio, em situação de exclusão social e de completo isolamento, exige
que toda e qualquer conduta que possa ser nefasta e contrária ao
interesse dos idosos e a quem deles se pretenda aproveitar, deverá
merecer a inerente censura social e ser sancionada, quando a mesma se
enquadrar em tipo penal legalmente previsto.
Temos,
porém, de ter a consciência de que é precisamente nos grupos de mais
baixa condição económica que, na maior parte dos casos, as alegadas
situações de abandono ocorrem, pois tanto os cuidadores como o idoso
vivem em condições abaixo do limiar da pobreza e, portanto, com maiores
dificuldades em prestar um apoio e uma mais cuidada assistência.
Esta
realidade exige do legislador que não ceda à tentação de fazer leis que
visem incriminar e sancionar quem não tem recursos, reconduzindo tudo a
uma questão de condição económica, sem a inerente resposta social, que é
exigida do Estado.
Desvalorizar
a falta de resposta social, como transparece de alguns setores de
opinião que assumem um discurso público de resposta no plano criminal,
não é o caminho certo.
Soluções
estribadas na criminalização de comportamentos, ou no agravamento das
sanções penais, padecem da incapacidade em perceber a dimensão social da
questão, assim como tentativas de alteração do Código Civil,
modificando o regime das incapacidades e o seu suprimento e de adequação
da legislação avulsa a este novo regime, que não assentem na primazia
da autonomia do visado, respeitando a sua vontade, capacidade e
autonomia, correm contra os ventos do tempo.
Deputado eleito pelo PS
Deputado eleito pelo PS
Acréscimos deste blogueiro: a questão do envelhecimento populacional, que levou recentemente o governo inglês a criar o ministério da solidão, tem a unir tal questão com a inteligência artificial e o pagamento público de servidores imbuídos de prestar serviços aos idosos que se encontram em situação de solidão e necessitam de cuidados subvencionados pelo Estado, sendo parte dos recursos provenientes da taxação da empresas de Inteligência Artificial. Assim, encaixa-se a panela à sua tampa e tenta-se equacionar os dilemas do envelhecimento crescente das sociedades modernas.
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