Por Cíntia Aleixo*, psicologa clínica e coachEspecial para o Papo de Mãe
Eu vejo discursos justos que defendem comidinhas orgânicas, yoga para crianças, consumo zero de lactose. E, por que não, cuidar também das relações e do respeito pelo outro, seja este outro quem for? Existe sinônimo para a palavra respeito que não se estenda a todas as classes sociais?
Eu pouco dirijo a vocês, meus seguidores, questões pessoais relacionadas a minhas convicções com relação a cor da minha pele.
Mas hoje os limites que estão entre o que eu não desejo (e o que eu desejo) para a minha filha me colocam mais uma vez neste lugar de mãe, profissional e influenciadora de muitas outras mães que não sabem das experiências que os próprios filhos vivenciam e provocam na vida do outro.
Sei que a minha filha, que é negra também, vai conviver com o racismo – porque ele existe, todos sabemos. Seja descarado ou velado. Mas eu esperava que estas “diferenças” que o outro enxerga na gente, na nossa família, no meu casamento, na minha estrutura familiar, fossem acontecer mais tarde, com mais idade, e não neste momento. Aliás, não é a primeira vez que tenho que explicar o inexplicável para um criança que hoje tem 6 anos de idade.
Ela já quis ter cabelo amarelo, já ouviu da mãe da amiguinha falar da surpresa que sentia sobre a filha se dar bem com pessoas negras…
Recentemente eu soube de uma criança que foi comparada, em visita escolar, às crianças de um abrigo por ser negra. Ela era a única negra entre os coleguinhas da escola, que ainda disseram que “os meninos e meninas negros do abrigo pareciam africanos e davam medo”. Não há como negar que estas crianças reproduzem o que ouvem em casa. Pais e mães precisam ter uma responsabilidade crucial para não criar filhos racistas.
No imaginário de crianças que não são negras pode surgir a ideia de que todas as crianças negras do Brasil são africanas, desnutridas, doentes, sujas e precisam de ajuda. Como se fosse algo distante. E ainda: parece que a criança negra que frequenta uma escola “de elite” está no lugar errado, como se não pertencesse a ele. A conversa da igualdade precisa começar em casa e continuar na escola.
O orgulho da nossa história e das nossas raízes é enorme, mas o que é preocupante é a forma que o estereótipo da criança negra e africana rodeia os pensamentos de nossa sociedade e, consequentemente, o imaginário das crianças .
Seria este um estereótipo positivo?
Medo? Medo. Medo de que?
O medo deve existir provavelmente pela violência que existe em nossa sociedade. Mas negros e brancos se encontram em um lugar comum (não igualitário) de possibilidades.
A questão não é somente a violência.
As crianças fantasiam com muita facilidade. Encaram fatos de acordo com os seus pensamentos, com o que ouvem e vêem. Cabe a nós, pais, sermos os responsáveis por elas em todos os sentidos. Para, inclusive, construir e desconstruir suas verdades atravessadas pelas conversas “dos adultos da casa”.
Muita atenção ao que falamos e fazemos. Afinal, a criança reproduz até o que não é dito.
*Cíntia Aleixo é Psicologa Clínica com especialização em Psicologia Perinatal, coach e idealizadora do Projeto Possibilidades Maternas, através do qual oferece suporte psicológico para mães através de grupos terapêuticos, Palestras.
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