domingo, 12 de dezembro de 2021

Não há quem investigue o poder das milícias

Janio de Freitas     JornalistaJanio de Freitas


Descrição de chapéu Folhajus

Com diretor que oscila entre a sujeição e a omissão, Polícia Federal vive uma crise silenciosa


O novo desmonte no sistema institucional difere dos anteriores. Enfraquece, por abandono ou deformação, quantidade muito maior das obrigações de Estado e de governo. Atingida é a Polícia Federal, que vive uma crise silenciosa, com os afastamentos sucessivos de chefes e delegados de alto conceito, medidas injustificáveis e a direção exercida mais pelo ministro da Justiça do que pelo diretor Paulo Maiurino.

Inexpressivo como delegado, Anderson Torres, como ministro, é visto pelos indignados da PF como um agente de Bolsonaro e filhos. Maiurino, como alguém que oscila entre a sujeição e a omissão. Uma situação em que os objetivos da PF se esvaem e as atividades da função emperram. A autonomia fundamental da PF e sua condição de órgão do Estado, não do governo, estão oprimidas por interesses políticos e outros. Para um país diante de difícil processo eleitoral e com prolífica criminalidade, a deterioração de uma polícia federal já insuficiente é, no mínimo, mais uma ameaça antidemocrática.

Polícia sob influência política ou de outros interesses é como força auxiliar da ilegalidade, ao relegar suas funções. As atividades ilegais na Amazônia, postas há pouco em breve destaque pelo garimpo no rio Madeira, exemplificam bem essa deformação.

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Não é recente o conhecimento da PF e das Forças Armadas de que milícias do Sudeste dirigem focos crescentes de garimpo, desmatamento e contrabando de sua produção.

Muito mais amplo foi o conhecimento de que o Ministério do Meio Ambiente se tornou incentivador das atividades ilegais, desde que Bolsonaro entregou a Ricardo Salles a tarefa de direcioná-lo.

A combinação devastadora desses dois fatores, porém, não gerou a reação devida pelo governo. As raras iniciativas foram logo reprimidas, como na exoneração do delegado Alexandre Saraiva por investigar as relações de Ricardo Salles com a exploração e o comércio ilegais de bens amazônicos. As fotos impressionantes de 200 ou 300 balsas recolhendo ouro no Madeira, para envio ao exterior e a São Paulo, obrigaram a PF a agir: incendiou algumas balsas, afundou algumas outras, e a ação se encerrou com a publicação das fotos. Bolsonaro não faltou com uma explicação, indireta mas clara, para a inação da PF: deu apoio aos garimpeiros ilegais.

As sete autorizações para exploração mineral em área de preservação no Amazonas decorrem dos mesmos fatores e conexões. O general Augusto Heleno só entrou com a assinatura para a doação. A defesa que faz da ordem recebida e cumprida vem de uma distorção, como sempre. Sua secretaria tem obrigação de zelar pela faixa de fronteira, dando parecer sobre atividades aí, não tem poder de conceder a exploração privada do subsolo que é patrimônio da União. Nem os presenteados com os privilégios não poderiam ser escolhidos a dedo. São suspeitos e já está visto que incluem ao menos um com passado de ilegalidades.

Não há quem investigue a presença miliciana e das quadrilhas já conhecidas nessa orgia de ilegalidades. Se o Senado, em outro acesso de respeito ao país, decidisse fazer uma CPI para investigar as ligações de milícias com o Poder, dependeria de investigações que a PF não faria. Ou não faria como devessem ser.

Entre os chamados federais há, e não seriam poucos, os que atribuem o fuzilamento do capitão Adriano da Nóbrega, no interior da Bahia, à sua exigência de proteção em troca de silêncios que, quebrados, seriam fatais para numerosos integrantes e circunstantes do poder. A importância desse capitão no subpoder criminal mede-se pelas homenagens que Bolsonaro lhe prestava, com discurso na Câmara, condecoração e, depois, defesa contra as condenações. Os filhos tiveram a missão de visitantes-emissários do preso.

Hoje, as milícias têm mais poder e proteção do que as polícias que têm hostilizá-las. E, a respeito, nada há a fazer. Bem, há, mas não há quem faça.

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