Janio de Freitas Jornalista
Com diretor que oscila entre a sujeição e a omissão, Polícia Federal vive uma crise silenciosa
O novo desmonte no sistema institucional difere dos anteriores. Enfraquece, por abandono ou deformação, quantidade muito maior das obrigações de Estado e de governo. Atingida é a Polícia Federal, que vive uma crise silenciosa, com os afastamentos sucessivos de chefes e delegados de alto conceito, medidas injustificáveis e a direção exercida mais pelo ministro da Justiça do que pelo diretor Paulo Maiurino.
Inexpressivo como delegado, Anderson Torres, como ministro, é visto pelos indignados da PF como um agente de Bolsonaro e filhos. Maiurino, como alguém que oscila entre a sujeição e a omissão. Uma situação em que os objetivos da PF se esvaem e as atividades da função emperram. A autonomia fundamental da PF e sua condição de órgão do Estado, não do governo, estão oprimidas por interesses políticos e outros. Para um país diante de difícil processo eleitoral e com prolífica criminalidade, a deterioração de uma polícia federal já insuficiente é, no mínimo, mais uma ameaça antidemocrática.
Polícia sob influência política ou de outros interesses é como força auxiliar da ilegalidade, ao relegar suas funções. As atividades ilegais na Amazônia, postas há pouco em breve destaque pelo garimpo no rio Madeira, exemplificam bem essa deformação.
Paulo Maiurino, diretor-geral da Polícia Federal
Não é recente o conhecimento da PF e das Forças Armadas de que milícias do Sudeste dirigem focos crescentes de garimpo, desmatamento e contrabando de sua produção.
Muito mais amplo foi o conhecimento de que o Ministério do Meio Ambiente se tornou incentivador das atividades ilegais, desde que Bolsonaro entregou a Ricardo Salles a tarefa de direcioná-lo.
A combinação devastadora desses dois fatores, porém, não gerou a reação devida pelo governo. As raras iniciativas foram logo reprimidas, como na exoneração do delegado Alexandre Saraiva por investigar as relações de Ricardo Salles com a exploração e o comércio ilegais de bens amazônicos. As fotos impressionantes de 200 ou 300 balsas recolhendo ouro no Madeira, para envio ao exterior e a São Paulo, obrigaram a PF a agir: incendiou algumas balsas, afundou algumas outras, e a ação se encerrou com a publicação das fotos. Bolsonaro não faltou com uma explicação, indireta mas clara, para a inação da PF: deu apoio aos garimpeiros ilegais.
As sete autorizações para exploração mineral em área de preservação no Amazonas decorrem dos mesmos fatores e conexões. O general Augusto Heleno só entrou com a assinatura para a doação. A defesa que faz da ordem recebida e cumprida vem de uma distorção, como sempre. Sua secretaria tem obrigação de zelar pela faixa de fronteira, dando parecer sobre atividades aí, não tem poder de conceder a exploração privada do subsolo que é patrimônio da União. Nem os presenteados com os privilégios não poderiam ser escolhidos a dedo. São suspeitos e já está visto que incluem ao menos um com passado de ilegalidades.
Não há quem investigue a presença miliciana e das quadrilhas já conhecidas nessa orgia de ilegalidades. Se o Senado, em outro acesso de respeito ao país, decidisse fazer uma CPI para investigar as ligações de milícias com o Poder, dependeria de investigações que a PF não faria. Ou não faria como devessem ser.
Entre os chamados federais há, e não seriam poucos, os que atribuem o fuzilamento do capitão Adriano da Nóbrega, no interior da Bahia, à sua exigência de proteção em troca de silêncios que, quebrados, seriam fatais para numerosos integrantes e circunstantes do poder. A importância desse capitão no subpoder criminal mede-se pelas homenagens que Bolsonaro lhe prestava, com discurso na Câmara, condecoração e, depois, defesa contra as condenações. Os filhos tiveram a missão de visitantes-emissários do preso.
Hoje, as milícias têm mais poder e proteção do que as polícias que têm hostilizá-las. E, a respeito, nada há a fazer. Bem, há, mas não há quem faça.
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