Eleição de Trump e ícone Bernie Sanders impulsionaram tendência, sobretudo entre jovens eleitores.
29 jan 2018
No fim do primeiro ano de mandato, apenas 39% dos americanos aprovavam o
trabalho feito pelo presidente Donald Trump. Isso é menos do que obteve
qualquer outro presidente americano, nesse mesmo momento, em ao menos
40 anos. Seus oponentes, os democratas, não estão muito melhor. Segundo
uma pesquisa do fim de 2017, apenas 37% dos americanos têm uma opinião
favorável sobre os políticos do partido.
Para encontrar uma corrente política que não teve baixas no ano que
passou é necessário dar uma olhada para a esquerda política americana.
Organizações socialistas, há muito relegadas às margens da popularidade e
influência ou até mesmo perseguidas pelas suas posições, estão
experimentando um considerável aumento de popularidade desde a chegada
de Trump à Casa Branca.
Uma organização em especial viu um salto no seu número de filiados.
Fundada em 1982, a Socialistas Democráticos da América (DSA) manteve
cerca de 6 mil membros pagantes ao longo de sua história. Hoje afirma
ter cerca de 25 mil filiados de carteirinha, triplicando de tamanho em
apenas um ano. Isso significa que ela é a maior organização socialista,
em número de filiados, desde o fim da Segunda Guerra Mundial nos Estados
Unidos.
"Depois da eleição de Trump, explodimos em tamanho", afirma a diretora
nacional, Maria Svart. Ela atribui o crescente interesse pela DSA não
apenas à reação adversa a Trump como também ao fracasso do Partido
Democrata em oferecer uma oposição ao presidente republicano. "Nossa
organização é uma alternativa para setores há muito negligenciados pelos
democratas", diz Svart.
Espectro amplo
A DSA não é um partido político, mas uma organização com membros
pagantes, muitos dos quais são voluntários que apoiam políticos de
esquerda, sindicatos ou campanhas, como a que pressiona por um sistema
de saúde estatal. A organização usa a expressão "socialismo democrático"
para se distanciar de governos socialistas autoritários, como a antiga
União Soviética.
Entre os membros famosos da DSA estão os filósofos Cornel West e Noam
Chomsky e a escritora Barbara Ehrenreich. A DSA se considera uma
organização socialista de espectro amplo, o que significa que seus
membros incluem desde pessoas que simpatizam com a esquerda democrata
até leninistas.
Nas eleições de novembro de 2017, 15 candidatos apoiados pela DSA
conquistaram mandatos em governos estaduais e municipais em todo o país.
Alguns concorreram pelo Partido Democrata, outros como independentes.
Em alguns casos, a DSA apoia candidatos do Partido Democrata, mas isso
não significa que haja algum tipo de relação formal entre as duas
organizações. Membros da DSA dizem que os democratas são reticentes no
apoio a socialistas em geral. Questionado, o Partido Democrata não
comentou.
A DSA também não é a única organização de esquerda a ver seu número de
filiados aumentar. Brian Bean, da Organização Internacional Socialista,
diz que sua instituição cresceu 40% no ano passado. Duas mil pessoas
participaram da conferência anual socialista da organização em julho de
2017, uma alta de 30% em relação ao ano anterior.
"Principalmente os jovens estão vendo o socialismo de maneira mais
positiva", comentou Bean. A Organização Internacional Socialista é bem
menor que a DSA - e também bem mais à esquerda.
O ícone Bernie Sanders
Poucos políticos nos Estados Unidos se intitulam socialistas, com uma
notória exceção: o senador Bernie Sanders. Ele se lançou à presidência
como um democrata, em 2016, desafiando Hillary Clinton nas primárias do
Partido Democrata e descrevendo a si mesmo como um "socialista
democrático".
O rótulo não parece tê-lo prejudicado: uma pesquisa de outubro de 2017
apontou Sanders como o político mais popular dos Estados Unidos, com 53%
de aprovação - o único político de alcance nacional visto de maneira
favorável por uma maioria de americanos.
Apesar de ele nunca ter sido membro da DSA, Sanders reivindica fazer
parte de sua tradição. Segundo Margaret McLaughlin, presidente do
escritório de Washington da DSA, Sanders - intencionalmente ou não -
levou milhares de jovens para a organização desde a vitória de Trump.
"Acho que apenas a associação com o nome - a similaridade entre a forma
como Bernie se refere a si mesmo e a nossa organização - levou muitas
pessoas que estavam entusiasmadas com o que Bernie dizia a se unirem a
nós", comenta.
Popularidade entre os jovens
Os Estados Unidos tiveram uma relação tensa com o socialismo ao longo
da sua história. Em 1920, o candidato do Partido Socialista Eugene Debs
ganhou cerca de 1 milhão de votos - o único porém é que ele estava na
cadeia. Nos anos 1950, o Congresso, liderado pelo senador Joseph
McCarthy, levou socialistas americanos à Justiça por causa de suas
relações reais ou inventadas com a União Soviética. Desde então, os
socialistas não têm uma presença política significativa na política dos
Estados Unidos.
Para alguns analistas, a popularidade de Sanders e o recente
crescimento da DSA representam uma nova era de aceitação do socialismo
nos Estados Unidos.
"Eu cresci nos anos 1980, quando não havia palavrão pior na política
americana do que 'socialismo'", comenta o professor de história Jason
Martinek, da New Jersey City University. "Agora não é mais assim. A
geração do milênio, que não tem a bagagem de Guerra Fria de seus pais ou
avós, parece mais aberta às ideias socialistas."
De fato, 51% dos americanos entre os 18 e os 29 anos de idade disseram
que preferem viver numa sociedade socialista ou comunista do que numa
capitalista ou fascista, segundo uma pesquisa de 2017.
O historiador Eric Foner, da Universidade Columbia, confirma que há um
interesse maior pelo socialismo entre os jovens. Mas, segundo ele, o
socialismo de Sanders tem mais a ver com a social-democracia europeia do
que com o socialismo histórico.
"Hoje em dia, quando as pessoas falam em socialismo, elas costumam ter
em mente uma versão melhorada do New Deal," explica Foner, referindo-se à
onda de investimentos em infraestrutura e serviços sociais ocorrida
depois da Grande Depressão, nos anos 1930, e impulsionada pelo
presidente - democrata - Franklin Delano Roosevelt.
Muitos socialistas acreditam que seu maior apoio está na nova geração
de eleitores. "Muitos dos comunistas no Twitter têm menos de 18 anos
porque eles não associam nada à União Soviética", diz McLaughlin.
Para a direita, pode parecer assustador que, para muitos jovens
americanos, a palavra "socialista" não tenha uma conotação negativa.
Para a esquerda, é uma boa notícia. "Estamos saindo aos poucos da Guerra
Fria", comenta McLaughlin.
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