terça-feira, 23 de janeiro de 2018

Reduzir açúcar, sal e gorduras não chega: há mais medidas a caminho







Hoje, Diana Ferreira, de 33 anos, opta por produtos biológicos, frescos e, se possível, locais. Não consome laticínios, evita carnes vermelhas, sal ou açúcar em excesso. E vai ao ginásio com frequência. “Hoje sei que o nosso intestino é, sem dúvida, o nosso segundo cérebro”, diz ao DN




As taxas sobre as bebidas açucaradas levaram a uma redução do consumo de açúcar calculada em 5 500 toneladas
Oferecer água, fruta e produtos hortícolas nas cerimónias organizados pelo Estado; retirar os saleiros dos restaurantes e limitar a publicidade de produtos poucos saudáveis em eventos destinados a crianças. Estas são algumas das medidas previstas na Estratégia Integrada para a Promoção da Alimentação Saudável (EIPAS), publicada no final do ano, que, tal como disse ontem o secretário de Estado Adjunto e da Saúde, visa também chegar a acordo com a indústria para a reformulação de produtos como cereais, tostas, batatas fritas, bolachas e laticínios. A ideia é reduzir as quantidades de sal, açúcar e gordura trans nestes alimentos.
"Vamos com eles (indústria) discutir objetivos concretos para determinado conjunto de gamas de produtos, ao longo de vários anos. A nossa proposta é de três anos com metas anuais de redução de sal e de açúcar nos produtos que consideramos mais importantes para ver se conseguimos por esta via melhorar a qualidade da alimentação dos portugueses", afirmou Fernando Araújo em entrevista à Lusa. A ideia, prosseguiu, é "colocar objetivos de redução anuais, de modo a que estejam alinhados com as boas práticas europeias".
Contactado pelo DN, Pedro Graça, diretor do Programa Nacional para a Promoção da Alimentação Saudável da Direção-Geral da Saúde, explicou que estas são apenas algumas das 51 medidas que fazem parte da Estratégia publicada no final do ano e elaborada com a colaboração de sete ministérios. Um documento, frisa, que já mereceu elogios por parta da Organização Mundial de Saúde (OMS).




"Um dos objetivos é chegar a um consenso sobre os valores de redução a atingir em cada categoria de alimentos. Quando os acordos estiverem finalizados, haverá uma entidade externa que irá verificar se o que se acordou chega a bom porto", adiantou ao DN o nutricionista, acrescentando que esta medida "parte do princípio que há interesse de ambas as partes - Estado e empresas - para a mudança". No entanto, sublinhou, a "modificação terá de ser gradual, de forma a que a indústria não perca consumidores".
Os nutricionistas veem com bons olhos a intenção de reformular alguns alimentos. "Acho que o Estado está a ser sensato na tentativa de chegar a acordo com a indústria. É um diálogo que já provou ser muito útil em Inglaterra, por exemplo, onde o consumo de sal é mais baixo", afirmou Nuno Borges, da direção da Associação Portuguesa de Nutrição, destacando que, no caso do sal, a "margem de redução é brutal", pois os portugueses consomem mais do dobro do que é recomendado pela OMS.
Já Isabel do Carmo, endocrinologista, reconheceu que "chegar a acordo com indústria é sempre muito difícil", mas espera que "o Governo tenha força suficiente para impor níveis mais baixos do que os praticados atualmente". Contudo, destacou, é importante lembrar que os resultados, nomeadamente "a redução das doenças cardiovasculares, "só vão surgir a longo prazo". E as medidas só têm impacto integradas "num programa geral em que a publicidade a alimentos hipercalóricos seja condicionada, por exemplo, e os estabelecimentos de comida rápida estejam longe da escola".
Entre as medidas previstas na EIPAS, destacou Pedro Graça, está precisamente a limitação da publicidade destinada a menores de idade de produtos alimentares com excesso de sal, açúcar e gordura trans. Mas há muito mais, nomeadamente estender a todos os organismos do Estado as restrições de venda de alimentos nas máquinas automáticas, incentivar as opções pela produção biológica nas compras públicas, alargar orientações alimentares a todos os ciclos de ensino e incentivar as empresas do setor agroalimentar a reduzir o tamanho das porções dos alimentos e bebidas pré-embalados.
O diretor do PNPAS reconheceu ao DN que "algumas medidas são muito fáceis de implementar, outras demorarão mais tempo e outras não sabemos se serão concretizadas na totalidade". No entanto, frisou, "é o primeiro passo para termos uma estratégia concertada" em Portugal com vista a uma alimentação mais saudável, sendo que a educação assume também um lugar de destaque nas medidas. "Não podemos trabalhar apenas na reformulação dos produtos, se as pessoas não quiserem comprar esses produtos", sublinhou o responsável.
Menos 5.500 toneladas de açúcar

Em 2017, os portugueses consumiram menos 5 500 toneladas de açúcar, uma descida associada à medida que taxou as bebidas açucaradas. Segundo o secretário de Estado da Saúde, esta diminuição deveu-se à redução do consumo, mas também à "reformulação dos produtos". Para o nutricionista Nuno Borges, "não é [uma redução] extraordinária, mas é um passo positivo e é possível que se atinjam valores mais relevantes no futuro". O dinheiro das taxas, prossegue, "devia ser aplicado em medidas eficazes de promoção de alimentação saudável e favorecimento de alimentos saudáveis".

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